sábado, 10 de novembro de 2012

Discurso proferido por Sua Excelência o Presidente da República, no acto de Encerramento da V Assembleia-Geral da Plataforma de ONG, Assembleia Nacional, 10 de Novembro de 2012


Exmo. Sr Presidente da Assembleia Geral cessante,
Exmo. Sr. Presidente do Conselho de Direcção cessante,
Exmo. Sr. Presidente da Assembleia Geral eleito,
Exmo. Sr. Presidente do Conselho de Direcção eleito,
Exmos. Srs. Representantes das ONGs,
Minhas Senhoras, meus Senhores,
Caros Amigos,

Estar aqui perante vós tem, para mim, um significado muito especial, pois a sensação que tenho não é a de estar perante representantes de uma determinada colectividade, como por exemplo são os Deputados da Nação, mas perante a própria colectividade, perante um pedaço vivo da Nação.


Do meu ponto de vista as Organizações Não-Governamentais são praticamente a essência da Democracia, isto é, entidades que congregam pessoas que abraçam determinados princípios, plasmados na nossa Constituição, e dão-lhes corpo, tornam-nos reais, concretos, nas parcelas mais recônditas do nosso país, movidos pelo nobre sentimento de participar da construção do bem-estar e da felicidade das pessoas.

Organizações que, não movidas pelo desejo de conquistar o poder - ambição legitima quando enformada pelos princípios democráticos -, fundam-se na vontade de materializar princípios de solidariedade, desenvolvimento, direitos humanos e estão sempre em sintonia com os anseios das pessoas, particularmente das que mais sofrem ou têm menos possibilidades de ter voz.

Minhas Caras, Meus Caros,

Olhando para vós, vindos de quase todos os cantos do país, aprecio a nossa gente, contemplo o inquieto camponês deste país que rega com o seu suor e fertiliza com a sua esperança a terra - nem sempre parceira- de onde teima em tirar o seu sustento.

Vejo as mulheres destas ilhas que, de sol a sol, carregam no colo os filhos deste país, que somos todos nós. Vejo a nossa inquieta e, por vezes, angustiada juventude que quer construir o seu sonho, domar o destino, acreditar na possibilidade da bem-aventurança.
Sinto-me perante o Cabo Verde autêntico que quer acertar o passo com o seu tempo.

Minhas Senhora e meus Senhores,
  
Tenho afirmado, em diversas ocasiões, que um dos grandes ganhos do nosso sistema democrático é o poder local autónomo e democrático, pois permite uma ligação quase directa entre o cidadão e o Estado. Continuo a pensar que em termos institucionais esta é uma realidade irrefutável.

Porém, o nosso edifício democrático, e que extrapola a esfera institucional, fica incompleto se o grande movimento da sociedade civil, altamente estimulado pela instauração da democracia, não for levado em devida conta.

É indiscutível que o movimento de cidadania, voltado para a afirmação dos princípios democráticos, muito frequentemente inserido no processo de desenvolvimento e de resolução de problemas concretos das pessoas, constitui também um importante ganho para o nosso país.

Contactar directamente com protagonistas deste processo não pode deixar de sensibilizar o Chefe de Estado e de comover o cidadão que há muito tempo fez desta causa uma das principais bandeiras da sua vida.

Reconhecer os importantes ganhos obtidos no domínio da afirmação da cidadania não implica que não existam grandes dificuldades a esse nível. Aliás, de forma aparentemente paradoxal, podemos dizer que o movimento da sociedade civil é um grande ganho, mas, simultaneamente, constitui ainda um pilar pouco sólido.

Um grande ganho na medida em que representa o desabrochar de uma corrente de energias que, por razões políticas, se encontrava represada. Mas, na perspectiva de ser, como nas democracias avançadas, uma instância de controlo do exercício do poder político, de fiscal e de condicionador desse poder, contribuindo para que ele seja exercido de forma adequada, ele apresenta ainda fragilidades visíveis.

A consolidação da sociedade civil, ligada ao fortalecimento do nosso sistema de justiça e de imprensa são elementos essenciais, ao lado de outros, para o reforço e aprofundamento da nossa democracia e o aprimoramento do Estado de direito.

Minhas senhoras e meus senhores,

Um dos indicadores do caminho percorrido pela sociedade civil pode ser aferido pela trajectória da Plataforma das ONGs que, como sabemos, agrupa mais de duas centenas e meia de Organizações Não-Governamentais. A sua simples existência reflecte essa realidade. Isto é, a existência de organizações que necessitam de ser federadas.

O percurso da Plataforma tem contribuído para a afirmação das organizações da sociedade civil, reforçando o seu poder, concedendo-lhes visibilidade e abrindo-lhes possibilidades antes inimagináveis.

Estes ganhos resultam da dinâmica que decorre da agregação de organizações antes dispersas, mas, essencialmente, das politicas materializadas pela Plataforma. Aliás, o relatório que vos foi apresentado, e que tive oportunidade de consultar, ilustra bem essa realidade.

Contudo, esse processo não é e nem podia ser linear porque, em grande medida, as intervenções dependem de recursos que não são sempre disponibilizados e do grau de envolvimento das diferentes organizações que, como sabemos, não é homogéneo.
Mas, a sua abrangência, em termos territorial, institucional, temático é, sem dúvida, a marca dessa intervenção.

A Plataforma procurou estender a sua acção a todo o território nacional, numa perspectiva descentralizadora, abrangendo todos os concelhos do país.

Essa estruturação que se não terá se consolidado por razões financeiras, terá, contudo, evidenciado a sua potencialidade ao permitir uma relação mais estreita entre as diferentes organizações e a Direcção nacional da Plataforma.

Gostaria de ressaltar a preocupação evidenciada no relatório com o reforço institucional das organizações e que tem passado pela capacitação dos seus membros de modo a habilitá-los a gerir melhor as suas organizações como a intervirem tecnicamente nas suas esferas de actividade.

Essa perspectiva é essencial porque, ao lado da legitimidade da actuação, a aquisição do conhecimento é de suma importância, pois ela constitui uma ferramenta fundamental na mediação entre a intenção e a prática, num mundo em que o conhecimento assume um papel cada vez mais determinante.

Assim, ainda que uma das preocupações centrais seja a realização de actividades geradoras de rendimento, fulcral na luta contra a pobreza e a exclusão social, o enfoque em questões primordiais como a saúde, a educação, a disponibilização de água, o meio ambiente, os direitos humanos, a igualdade e equidade género, traduz uma visão abrangente das ONGs.

As relações com organizações internacionais têm sido uma área de grande destaque, na dupla perspectiva que entendo de grande interesse: a captação de recursos, essenciais na nossa realidade, e a participação no debate que, a nível regional e mundial, se trava em torno do papel das Organizações Não-Governamentais no mundo de hoje.

Esperamos que estas relações tenham contribuído sobremaneira para a concretização da máxima: Pensar global e agir local. 

Minhas senhoras e meus senhores,

Todos sabemos que os tempos actuais não são fáceis e que as perspetivas imediatas encerram alguma preocupação. Estamos perante uma crise de acentuada gravidade, com repercussões sérias entre nós e que fazem ressaltar as nossas grandes limitações, nomeadamente, as grandes desigualdades sociais.

Acredito que, neste quadro, as Organizações Não-Governamentais poderão ter um papel de muito relevo, não na ideia da substituição do Estado, mas no sentido de uma actuação de forma autónoma, crítica e complementar, contribuindo para que significativas parcelas da nossa população, especialmente as mais desprotegidas, não sejam ainda mais penalizadas.

O tempo presente impõe à acção colectiva, mormente às ONGs, o desafio de, nesta conjuntura, da profunda internacionalização económica e de suas implicações na redefinições ao papel do Estado e às relações entre este e a sociedade civil, adequar formas de actuação social que sejam capazes de viabilizar as reivindicações populares e responder ao seu primordial objectivo que é o da transformação social.

Sabemos que existe uma tensão natural entre o Estado e as instâncias não estatais, o que até certo ponto é normal, uma vez que, embora os objectivos finais possam ser os mesmos, as lógicas e ritmos de intervenção e nem sempre são semelhantes.

Sabemos, igualmente, que umas das grandes limitações das ONGs são as pressões a que, muitas vezes, estão submetidas por parte dos partidos políticos e de estruturas do Estado, no sentido da validação acrítica de propostas, políticas e medidas, que, amiúde, configuram claras estratégias de manipulação politica.

Infelizmente, no nosso contexto, onde a escassez de recursos é gritante, essa tentação manipulatória é muito forte e a capacidade de resistência relativamente reduzida.

Quando se prevêem dificuldades que poderão ter impacto negativo no funcionamento das ONGs esse risco é claramente maior, pelo que é necessário estar-se vigilante.

Naturalmente que os activistas das ONGs não estão obstados de ter simpatia e mesmo militância político-partidária, mas o que se exige e se espera é que esta não condicione a intervenção das ONGs e, muito menos, que ela seja critério de definição de eventuais beneficiários da sua actuação.

Aliás, pensamos que é por estar atenta a esta s questões que a Plataforma concedeu importância particular ao Código de Ética das ONGs e associações de fim não lucrativo e que tem insistido na necessidade de se definir com muita clareza o quadro legal das relações entre o Estado e as ONGs, nomeadamente no que respeita aos critérios de financiamento de determinadas actividades através do orçamento do Estado e à regulação das formas de acesso aos recursos do Estado.

Entendo que as dificuldades que se avizinham longe de servirem de pretexto para o adiamento do debate e decisões sobre essas questões devem, pelo contrário, servir de incentivo para a sua clarificação, pois permitirão actuações mais claras, objectivas e racionais.

É evidente que a definição de quadros legais que devem regular essas questões é de suma importância, mas mais do que  leis é a consciência cidadã das mulheres e homens, como vocês, que, no quotidiano, entrelaçam as necessidades aos princípios, dedicação e pragmatismo e, deste modo, dão sentido e vida a essas normas.

Nesta linha ainda, consideramos muito importante a proposta do Observatório Eleitoral Doméstico que objectiva o reforço da participação da sociedade civil no processo eleitoral, promovendo nas organizações da sociedade civil a capacidade para acompanhar os processos eleitorais nacionais e, por esta via, aprofundar o exercício da cidadania.

O país, os cidadãos, as pessoas reconhecem o vosso trabalho, a vossa dedicação e o vosso compromisso com a Nação.

Minhas Senhoras e meus senhores,

Agradeço as generosas palavras que me foram dirigidas, felicito a direcção cessante pelo apreciável trabalho desenvolvido ao longo do seu mandato.

Aos dirigentes que acabam de ser empossados apresento os meus parabéns e votos de muito sucesso na condução dos destinos da organização.

Aos representantes de ONGs de todo o país desejo as maiores felicidades nesta nobre tarefa de desfraldar as bandeiras da solidariedade, da justiça social e da democracia.
Declaro encerrada a V Assembleia-Geral da Plataforma de ONG.

Muito obrigado pelo convite e pela atenção.

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