segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Discurso proferido por Sua Excelência o Senhor Presidente da República de Cabo Verde na Sessão Solene da Assembleia Municipal da Ribeira Brava Câmara Municipal da Ribeira Brava, 1 de Outubro de 2012

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Senhor Presidente da Assembleia Municipal,
Senhor Presidente da Câmara Municipal,

Senhores Eleitos Municipais,

Forças Vivas do Concelho,

Minhas senhoras e meus senhores,

Caros amigos,


Gostaria de, para começar, cumprimentar todos os presentes e, através dos senhores, todos aqueles que, por uma razão ou outra, não puderam brindar-nos com a sua presença.

Em menos de 72 horas deixei um encontro com empresários cabo-verdianos e americanos do outro lado do Atlântico, nos Estados Unidos da América, para me encontrar convosco nesta encantadora cidade da Ribeira Brava, que muitos pretendem, talvez compreensivelmente, designar por cidade Vila da Ribeira Brava.  

 

A emoção que experimento neste momento vai muito além da grande alegria que sempre me invade quando piso este chão. Ela traduz o sentimento de estar a ser a ponte entre pontas, entre as partes de um todo. De estar a ligar Ribeira Brava a Boston. É uma representação quase corpórea, diria, da verdadeira dimensão de Cabo Verde.

 

Em apenas setenta e duas horas, tenho a oportunidade de, pela primeira vez, dividir directamente com cabo-verdianos residentes no país esta experiência única: a interiorização clara da grandeza da Nação cabo-verdiana que a Diáspora e a nossa Cultura ampliam quase até o infinito, e o papel que é reservado ao Presidente da República e que assumo de alma e coração, de ser o promotor primeiro dessa realidade que a História vem talhando.

 

Coincidência ou não, é-me particularmente grato partilhar este sentimento com gente deste espaço que é uma das mais importantes fontes da nossa cultura, dessa cultura diversificada, mestiça, que molda o nosso espírito, que impregna o nosso ser, que consubstancia a nossa originalidade.

 

A ilha de S. Nicolau tem dado e continua a dar uma contribuição ímpar ao nosso país nas mais diversas áreas. Mas é, sem dúvida, na esfera cultural que a sua marca é quase indelével. O impacto que o Seminário-Liceu teve na formação da intelectualidade cabo-verdiana e na cristalização de determinados aspectos da nossa cultura, não obstante as limitações próprias da época, constitui um dos marcos dessa contribuição. Nomes como Baltasar Lopes, José Lopes, Pedro Corsino de Azevedo, Jaime Figueiredo e João Lopes personificam essa profunda relação da ilha com a Cultura cabo-verdiana. Gabriel Mariano, Olavo Moniz, e outros, aliado à genialidade de Paulino Vieira, souberam dar continuidade a essa tradição de importante produção cultural da ilha. A esse propósito, neste dia em que se celebra o Dia Mundial da Música apraz-me dirigir uma palavra de estímulo e felicitações a todos os músicos de Cabo Verde que diariamente contribuem para levar o nome do país aos quatro cantos do planeta. A eles deixo, em nome da Nação, um grande obrigado.

 

Minhas Senhoras e meus Senhores,

 

Permitam-me um cumprimento especial aos eleitos municipais, saídos das últimas eleições autárquicas. Desejo-lhes um bom desempenho no mandato que acabam de começar, não importando qual o papel que o eleitorado lhes tenha confiado. Em democracia, a oposição deve disponibilizar-se para cooperar com o poder para a realização do bem comum; a situação deve ter suficiente abertura de espírito para receber e tratar os contributos oriundos da oposição. Isto não implica que um e outro se anulem ou abdiquem das suas posições ideológicas e dos seus princípios. Muito longe disso. As diferenças e os dissensos são o sal da democracia e é na diferença que deveremos todos nos empenhar para a consolidação das conquistas feitas até aqui e para a progressiva realização das que ainda não foram totalmente alcançadas. O exercício que a situação e a oposição devem fazer, em permanência, é o de respeitar a diferença e o diferente. Como costumo dizer, não há democracia sem democratas. Conquistamo-la, mas há ainda muito caminho a percorrer para que o desejo da Nação, consubstanciado na nossa Lei Fundamental - que completa os vinte anos de existência - possa se ver reflectido na vida dos homens e mulheres deste país. Para tanto, a participação de todos, mormente dos eleitos municipais, mas também dos munícipes e o empenho dos demais poderes públicos, é uma exigência.

 

Os naturais da ilha de Chiquinho, na oposição ou na situação, estarão todos interessados no desenvolvimento de S. Nicolau e no bem-estar das gentes da ilha. Poderão ter divergências em matéria de vias, prioridades ou estilo. Mas, no essencial, todos estão interessados no desenvolvimento da sua ilha. Por isso, estou certo de que deixarão de lado o acessório e concentrar-se-ão no essencial para o desenvolvimento de S. Nicolau e para a melhoria da qualidade de vida dos vossos vizinhos e amigos.

 

Minhas senhoras,
Meus senhores,

 

Depois de um interregno ditado pelo calendário eleitoral, eis que retomo, no país, o contacto directo com as pessoas, o exercício da presidência de proximidade, interrompido em Maio passado.

 

Creio que todos compreenderão que, tendo sido eleito sob a bandeira um Presidente junto das pessoas e tendo prestado juramento no sentido de ser um árbitro e um moderador do sistema e de ter um compromisso com a Nação de agir sempre no quadro caracterizador de uma magistratura de influência, as visitas de contacto com os cabo-verdianos, residentes nas ilhas do arquipélago e da diáspora, constituem uma metodologia adequada para o exercício do mandato. Tais encontros constituem momentos privilegiados para o Chefe de Estado auscultar as comunidades e as lideranças locais, com o intuito de conhecer o que lhes vai na alma: seus problemas, suas necessidades e esperanças; seus sonhos, suas aspirações e desejos.

 

É essa  relação que, para além das disposições formais e legais, empresta conteúdo à função presidencial, como a concebo. É esse contacto com gente, com pai e mãe, com jovens, com rosto, com nome, que é muito mais do que um eleitor ou uma informação estatística, que me motiva, me impulsiona e, do meu ponto de vista, confere verdadeira grandeza ao exercício do cargo de Presidente de todos os cabo-verdianos.

A deslocação do Chefe de Estado a todas as ribeiras e fajãs do arquipélago, a todos os cantos onde haja um cabo-verdiano emigrado, é a via que escolhi para garantir alguma equidade às comunidades e às lideranças locais em matéria de acesso ao mais alto magistrado da Nação. E garanto que no que depender de mim, e no que estiver adentro da margem de poder que a Constituição me confere, sem esquecer os condicionalismos que a nossa situação impõe, todos os integrantes da grande Nação cabo-verdiana terão vez e voz. Por isso, estou aqui hoje, na Cidade da Ribeira Brava, e daí a minha enorme satisfação em estar com os munícipes e suas lideranças.

 

Senhor Presidente da Assembleia,
Senhor Presidente da Câmara,

 

Ser árbitro e moderador do sistema implica em conhecer as diversas realidades do país e de vida dos seus cidadãos, bem como se aperceber das posições de todos quantos tenham papéis relevantes no sistema. Compete ao Chefe de Estado estar atento aos fenómenos que se manifestam à sua volta para poder exercer, em tempo real, o seu papel de árbitro e moderador que é, ao cabo e ao resto, o de aproximar posições, por um lado, e o de fomentar a cooperação e a parceria, nas relações entre os titulares dos poderes do Estado, na prossecução do bem comum. 

 

 Minhas senhoras e meus senhores,

 

Uma das bandeiras que tenho desfraldado é o do combate às assimetrias regionais. Apenas esse combate permitirá que o desenvolvimento do país seja apropriado pelas pessoas. Apenas um desenvolvimento que permita que as diferentes regiões do país dele participem poderá assegurar que distorções não ocorram.

 

Acredito que um debate em torno dessa problemática, vital para o país, adquire em São Nicolau pertinência particular, pois temos assistido a uma tendência para uma estagnação ou mesmo retracção demográfica, à custa da camada mais jovem, que procura outras paragens para viver e trabalhar.

 

A livre circulação de pessoas e bens é uma das características muito positivas da nossa realidade, pelo que cabe ao cidadão a decisão de escolher o local (no país ou no exterior) onde residir e trabalhar. No entanto, quando a escolha não resulta de uma opção entre diversas possibilidades mas da ausência de condições na ilha, torna-se necessária uma profunda reflexão que conduza à adopção de políticas que objectivem alterar a situação. Estou certo de que todos desejarão desfazer, para sempre, o dilema do querer ficar mas ter que partir, tão bem retratado pelo músico desta terra, Armando Zeferino, no “Sodade”, um quase hino nacional.


É provável que respostas para esta questão sejam encontradas no quadro do debate sobre a descentralização e a regionalização, mas penso que, para certos problemas, tendo em conta a sua gravidade e permanência no tempo, soluções devem ser encontradas com urgência.

 

Senhor Presidente da Assembleia,
Senhor Presidente da Câmara,

 

De entre as questões a serem encaradas com celeridade estão a agricultura, a pecuária e os transportes.

 

A modernização da agricultura e da pecuária é de grande importância, bem como a adopção de políticas direccionadas para o envolvimento de jovens nessas actividades. Apenas por essas vias se poderá aspirar a um aproveitamento adequado das potencialidades existentes e à criação de condições para a fixação de boa parte dos filhos de S. Nicolau na terra que os viu nascer e onde, muito provavelmente, quererão permanecer.

 

Quanto à ligação e o desencravamento pleno desta ilha, este é um daqueles problemas que clama por resolução com toda a urgência que couber no possível. Mais do que uma questão meramente prioritária, a problemática das ligações de S. Nicolau aos principais mercados nacionais e ao mundo tornou-se uma questão estrategicamente relevante.

 

A relevância estratégica das ligações de S. Nicolau à Praia, ao Mindelo, ao Sal e ao mundo, advém-lhe do facto de a sua resolução plena ter impacto, directo e decisivo, não só no melhor escoamento da sua produção agrícola e do pescado capturado, na garantia dos seus emigrantes poderem vir de férias tranquilos porque não terão problemas com o voo de retorno ao país de acolhimento, mas, também, porque atrairia o turismo doméstico em busca das belezas naturais da ilha e, porque não, em busca do muito de história que aqui ainda vive; facilitaria a atracção de turistas estrangeiros que desejassem complementar o que encontram nas outras ilhas com o que São Nicolau tem para dar e vender; atrairia investidores, nacionais e estrangeiros. Um turista amante da caça e da pesca, por exemplo, encontraria, na terra e no mar de São Nicolau, razões para querer voltar e para recomendar parentes e amigos aficcionados a visitarem a ilha. Dirão que a caça já não abunda. Eu diria que seria uma oportunidade para investir na criação de uma reserva, bem protegida, regida por normas bastante claras, mormente no que concerne ao tipo de expedições de caça que, jamais e em tempo algum poderá ser predatória. A identificação das melhores experiências nos espaços onde existem reservas e práticas idênticas poderá ser de grande utilidade, Senhores Eleitos Municipais e Forças Vivas do Concelho.

 

Tenho conhecimento de que o Governo da República está preocupado com a situação e que está a trabalhar por uma solução. Sei que os eleitos municipais dos dois concelhos da ilha farão o seu melhor, nas reivindicações e na cooperação institucional com o Governo, para que a solução não tarde. Da minha parte, escusado será dizer que estarei atento ao problema e confiante na sua resolução, pois que julgo ser questão de relevância estratégica para a ilha e para o país. 

 

Na qualidade de defensor entusiasta do poder local comprometo-me a prosseguir na direcção de tudo fazer para que esse poder que se encontra mais perto das pessoas se consolide cada vez mais.

 

Como acredito que se houver um esforço de articulação e de harmonização de posições entre os dois municípios da ilha em torno de questões centrais para São Nicolau as soluções serão mais viáveis, lanço aos dois municípios o desafio de unirem esforços à volta dos problemas estruturais da ilha como forma de aumentar o poder negocial e a racionalidade das soluções adoptadas. 

 

Acredito que esta articulação terá resultados inestimáveis para as pessoas e para a ilha. No quadro das minhas atribuições, prometo tudo fazer para que esse objectivo seja atingido, se for essa a vontade dos responsáveis locais.

 

Mas estas visitas, estes encontros, são, para o Chefe de Estado, mais para ouvir do que para falar. Trago mensagens de esperança, mas o mais importante é escutar-vos: o que vos aflige, o que vos deixa falta e o que é preciso melhorar, para que melhore a vossa qualidade de vida.

 

Acreditem que sou um bom ouvinte.

 

Muito obrigado pela vossa atenção.

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