Exmo. Sr Presidente da Assembleia
Geral cessante,
Exmo. Sr. Presidente do Conselho de Direcção cessante,
Exmo. Sr. Presidente da Assembleia Geral eleito,
Exmo. Sr. Presidente do Conselho de Direcção eleito,
Exmos. Srs. Representantes das ONGs,
Minhas Senhoras, meus Senhores,
Caros Amigos,
Estar aqui perante vós tem, para mim, um significado muito
especial, pois a sensação que tenho não é a de estar perante representantes de
uma determinada colectividade, como por exemplo são os Deputados da Nação, mas
perante a própria colectividade, perante um pedaço vivo da Nação.
Do meu ponto de vista as Organizações Não-Governamentais
são praticamente a essência da Democracia, isto é, entidades que congregam
pessoas que abraçam determinados princípios, plasmados na nossa Constituição, e
dão-lhes corpo, tornam-nos reais, concretos, nas parcelas mais recônditas do
nosso país, movidos pelo nobre sentimento de participar da construção do
bem-estar e da felicidade das pessoas.
Organizações que, não movidas pelo desejo
de conquistar o poder - ambição legitima quando enformada pelos princípios
democráticos -, fundam-se na vontade de materializar princípios de
solidariedade, desenvolvimento, direitos humanos e estão sempre em sintonia com
os anseios das pessoas, particularmente das que mais sofrem ou têm menos possibilidades
de ter voz.
Minhas Caras, Meus Caros,
Olhando para vós, vindos de quase todos
os cantos do país, aprecio a nossa gente, contemplo o inquieto camponês deste
país que rega com o seu suor e fertiliza com a sua esperança a terra - nem
sempre parceira- de onde teima em tirar o seu sustento.
Vejo as mulheres destas ilhas que, de
sol a sol, carregam no colo os filhos deste país, que somos todos nós. Vejo a
nossa inquieta e, por vezes, angustiada juventude que quer construir o seu
sonho, domar o destino, acreditar na possibilidade da bem-aventurança.
Sinto-me perante o Cabo Verde autêntico
que quer acertar o passo com o seu tempo.
Minhas Senhora e meus Senhores,
Tenho afirmado, em diversas ocasiões,
que um dos grandes ganhos do nosso sistema democrático é o poder local autónomo
e democrático, pois permite uma ligação quase directa entre o cidadão e o
Estado. Continuo a pensar que em termos institucionais esta é uma realidade irrefutável.
Porém, o nosso edifício democrático, e
que extrapola a esfera institucional, fica incompleto se o grande movimento da
sociedade civil, altamente estimulado pela instauração da democracia, não for
levado em devida conta.
É indiscutível que o movimento de
cidadania, voltado para a afirmação dos princípios democráticos, muito
frequentemente inserido no processo de desenvolvimento e de resolução de
problemas concretos das pessoas, constitui também um importante ganho para o
nosso país.
Contactar directamente com protagonistas
deste processo não pode deixar de sensibilizar o Chefe de Estado e de comover o
cidadão que há muito tempo fez desta causa uma das principais bandeiras da sua
vida.
Reconhecer os importantes ganhos obtidos
no domínio da afirmação da cidadania não implica que não existam grandes
dificuldades a esse nível. Aliás, de forma aparentemente paradoxal, podemos
dizer que o movimento da sociedade civil é um grande ganho, mas,
simultaneamente, constitui ainda um pilar pouco sólido.
Um grande ganho na medida em que
representa o desabrochar de uma corrente de energias que, por razões políticas,
se encontrava represada. Mas, na perspectiva de ser, como nas democracias
avançadas, uma instância de controlo do exercício do poder político, de fiscal
e de condicionador desse poder, contribuindo para que ele seja exercido de
forma adequada, ele apresenta ainda fragilidades visíveis.
A consolidação da sociedade civil, ligada
ao fortalecimento do nosso sistema de justiça e de imprensa são elementos essenciais,
ao lado de outros, para o reforço e aprofundamento da nossa democracia e o
aprimoramento do Estado de direito.
Minhas senhoras e meus senhores,
Um dos indicadores do caminho percorrido
pela sociedade civil pode ser aferido pela trajectória da Plataforma das ONGs
que, como sabemos, agrupa mais de duas centenas e meia de Organizações Não-Governamentais.
A sua simples existência reflecte essa realidade. Isto é, a existência de
organizações que necessitam de ser federadas.
O percurso da Plataforma tem contribuído
para a afirmação das organizações da sociedade civil, reforçando o seu poder,
concedendo-lhes visibilidade e abrindo-lhes possibilidades antes inimagináveis.
Estes ganhos resultam da dinâmica que decorre
da agregação de organizações antes dispersas, mas, essencialmente, das
politicas materializadas pela Plataforma. Aliás, o relatório que vos foi
apresentado, e que tive oportunidade de consultar, ilustra bem essa realidade.
Contudo, esse processo não é e nem podia
ser linear porque, em grande medida, as intervenções dependem de recursos que
não são sempre disponibilizados e do grau de envolvimento das diferentes
organizações que, como sabemos, não é homogéneo.
Mas, a sua abrangência, em termos
territorial, institucional, temático é, sem dúvida, a marca dessa intervenção.
A Plataforma procurou estender a sua
acção a todo o território nacional, numa perspectiva descentralizadora,
abrangendo todos os concelhos do país.
Essa estruturação que se não terá se consolidado
por razões financeiras, terá, contudo, evidenciado a sua potencialidade ao
permitir uma relação mais estreita entre as diferentes organizações e a
Direcção nacional da Plataforma.
Gostaria de ressaltar a preocupação evidenciada
no relatório com o reforço institucional das organizações e que tem passado
pela capacitação dos seus membros de modo a habilitá-los a gerir melhor as suas
organizações como a intervirem tecnicamente nas suas esferas de actividade.
Essa perspectiva é essencial porque, ao
lado da legitimidade da actuação, a aquisição do conhecimento é de suma importância,
pois ela constitui uma ferramenta fundamental na mediação entre a intenção e a
prática, num mundo em que o conhecimento assume um papel cada vez mais
determinante.
Assim, ainda que uma das preocupações
centrais seja a realização de actividades geradoras de rendimento, fulcral na
luta contra a pobreza e a exclusão social, o enfoque em questões primordiais como
a saúde, a educação, a disponibilização de água, o meio ambiente, os direitos
humanos, a igualdade e equidade género, traduz uma visão abrangente das ONGs.
As relações com organizações
internacionais têm sido uma área de grande destaque, na dupla perspectiva que
entendo de grande interesse: a captação de recursos, essenciais na nossa
realidade, e a participação no debate que, a nível regional e mundial, se trava
em torno do papel das Organizações Não-Governamentais no mundo de hoje.
Esperamos que estas relações tenham
contribuído sobremaneira para a concretização da máxima: Pensar global e agir
local.
Minhas senhoras e meus senhores,
Todos sabemos que os tempos actuais não
são fáceis e que as perspetivas imediatas encerram alguma preocupação. Estamos
perante uma crise de acentuada gravidade, com repercussões sérias entre nós e
que fazem ressaltar as nossas grandes limitações, nomeadamente, as grandes
desigualdades sociais.
Acredito que, neste quadro, as Organizações
Não-Governamentais poderão ter um papel de muito relevo, não na ideia da
substituição do Estado, mas no sentido de uma actuação de forma autónoma,
crítica e complementar, contribuindo para que significativas parcelas da nossa
população, especialmente as mais desprotegidas, não sejam ainda mais penalizadas.
O
tempo presente impõe à acção colectiva, mormente às ONGs, o desafio de, nesta
conjuntura, da profunda internacionalização económica e de suas implicações na redefinições
ao papel do Estado e às relações entre este e a sociedade civil, adequar formas
de actuação social que sejam capazes de viabilizar as reivindicações populares
e responder ao seu primordial objectivo que é o da transformação social.
Sabemos que existe uma tensão natural entre
o Estado e as instâncias não estatais, o que até certo ponto é normal, uma vez
que, embora os objectivos finais possam ser os mesmos, as lógicas e ritmos de
intervenção e nem sempre são semelhantes.
Sabemos, igualmente, que umas das
grandes limitações das ONGs são as pressões a que, muitas vezes, estão
submetidas por parte dos partidos políticos e de estruturas do Estado, no
sentido da validação acrítica de propostas, políticas e medidas, que, amiúde,
configuram claras estratégias de manipulação politica.
Infelizmente, no nosso contexto, onde a
escassez de recursos é gritante, essa tentação manipulatória é muito forte e a
capacidade de resistência relativamente reduzida.
Quando se prevêem dificuldades que
poderão ter impacto negativo no funcionamento das ONGs esse risco é claramente
maior, pelo que é necessário estar-se vigilante.
Naturalmente que os activistas das ONGs
não estão obstados de ter simpatia e mesmo militância político-partidária, mas
o que se exige e se espera é que esta não condicione a intervenção das ONGs e,
muito menos, que ela seja critério de definição de eventuais beneficiários da sua
actuação.
Aliás, pensamos que é por estar atenta a
esta s questões que a Plataforma concedeu importância particular ao Código de
Ética das ONGs e associações de fim não lucrativo e que tem insistido na
necessidade de se definir com muita clareza o quadro legal das relações entre o
Estado e as ONGs, nomeadamente no que respeita aos critérios de financiamento
de determinadas actividades através do orçamento do Estado e à regulação das
formas de acesso aos recursos do Estado.
Entendo que as dificuldades que se
avizinham longe de servirem de pretexto para o adiamento do debate e decisões
sobre essas questões devem, pelo contrário, servir de incentivo para a sua
clarificação, pois permitirão actuações mais claras, objectivas e racionais.
É evidente que a definição de quadros legais
que devem regular essas questões é de suma importância, mas mais do que leis é a consciência cidadã das mulheres e
homens, como vocês, que, no quotidiano, entrelaçam as necessidades aos
princípios, dedicação e pragmatismo e, deste modo, dão sentido e vida a essas
normas.
Nesta linha ainda, consideramos muito
importante a proposta do Observatório Eleitoral Doméstico que objectiva o
reforço da participação da sociedade civil no processo eleitoral, promovendo nas
organizações da sociedade civil a capacidade para acompanhar os processos
eleitorais nacionais e, por esta via, aprofundar o exercício da cidadania.
O país, os cidadãos, as pessoas
reconhecem o vosso trabalho, a vossa dedicação e o vosso compromisso com a
Nação.
Minhas Senhoras e meus senhores,
Agradeço as generosas palavras que me
foram dirigidas, felicito a direcção cessante pelo apreciável trabalho
desenvolvido ao longo do seu mandato.
Aos dirigentes que acabam de ser
empossados apresento os meus parabéns e votos de muito sucesso na condução dos
destinos da organização.
Aos representantes de ONGs de todo o
país desejo as maiores felicidades nesta nobre tarefa de desfraldar as bandeiras
da solidariedade, da justiça social e da democracia.
Declaro encerrada a V Assembleia-Geral da
Plataforma de ONG.
Muito obrigado pelo convite e pela
atenção.
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