sexta-feira, 23 de março de 2012

Discurso proferido por Sua Excelência o Presidente da República, por ocasião da Sessão Solene nos Paços do Concelho do Maio, Ilha do Maio, 23 de Março de 2012

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Exmo. Senhor Presidente da Câmara Municipal do Maio,
Exmo. Senhor Presidente da Assembleia Municipal,
Exma. Senhora deputada nacional,
Exmos. Senhores vereadores e deputados,
Exmos. Senhores representantes das Forças Vivas da Ilha do Maio,
Exmos. Senhores autoridades religiosas e policiais,
Exmos. Senhores colaboradores da Presidência da República,
Exmos. Senhores jornalistas,
Caros munícipes,
Minhas Senhoras e meus senhores,

A sensação que experimentamos ao pisar chão tão delicado como o da ilha do Maio é a de uma imperiosa necessidade de ter um cuidado extremo para não destoarmos de um todo que parece tão fino e delicado que qualquer descuido pode comprometer. 


A relação com a sua gente tão especial e afável confere-nos a certeza de que, na realidade, estamos perante uma parcela ímpar de um Cabo Verde diferente, bonito, idílico, tão bem recortado na poesia e na melodia de um dos seus maiores trovadores, Betú.

Esta ilha única encerra um desafio complexo, qual seja: o de enfrentar os grandes problemas que preocupam as pessoas sem destruir a sua essência, sem quebrar o seu equilíbrio, sem macular o seu encanto.

De certa forma, tendo em conta a dimensão relativamente pequena do Maio, - o facto de grande parte dos seus problemas ser comum ao resto do país, de se encontrar numa fase inicial do aproveitamento das suas potencialidade turísticas, da existência de aspectos menos positivos em outros projectos turísticos -, a ilha do Porto Inglês, quase que assume a condição de laboratório, um laboratório humano, um laboratório vivo, que necessita de um cuidado extremo, rigoroso, para se compatibilizar homem, ambiente, cultura e desenvolvimento.

Acredito que ainda estamos em condições de harmonizar as necessidades de desenvolvimento com a inclusão social, evitando-se a segregação das pessoas que vivem e das que são atraídas para esta ilha. A criação de parcelas da população marginalizadas não pode, de forma alguma, ser encarada como um mal necessário, inevitável, como um preço inerente ao processo de desenvolvimento. Os interesses das pessoas, a apropriação por elas de parte dos rendimentos gerados pelo processo de desenvolvimento, devem ser uma preocupação constante.

Nessa linha, é necessário ter também presente que o desenvolvimento turístico deve ser encarado como o verdadeiro motor do desenvolvimento local e um agente potenciador do desenvolvimento de outras actividades económicas como a agricultura, a pecuária ou o artesanato.

Entendemos que se o objectivo do desenvolvimento é de facto propiciar riqueza e a inclusão social, deve-se procurar compatibilizar o turismo que reclama investimentos avultados, construções mais ou menos imponentes com o turismo mais próximo das pessoas, das famílias, das suas casas, do seu modo de ser e de estar com os outros.

Esta perspectiva, que tem sido denominada de turismo solidário, com o envolvimento das pessoas, com o aproveitamento cabal da cultura local, tem a virtude de assegurar uma efectiva participação das pessoas no processo de desenvolvimento, fazendo da preservação do seu modo de estar a grande atracção.

Ainda recentemente, no Concelho de Porto Novo, a propósito de turismo solidário, afirmei que “o turismo solidário, em que há uma grande participação das pessoas, tem como grande mérito o seu desenvolvimento num quadro de estrito respeito cultural e ambiental...”

Penso que as ideias expressas então podem ser transpostas para esta ilha como proposta capaz de fornecer um quadro de referência susceptivel de ajudar na articulação entre aspectos diferentes do processo de desenvolvimento turístico, quando se tem como horizonte investimentos de grande porte ou, por exemplo, a possível criação de 17 mil quartos.

Senhor Presidente da Câmara Municipal,
Senhora Presidente da Assembleia Municipal,
Ilustres convidados,
Minhas senhoras e meus senhores,

O destaque que concedo ao desenvolvimento turístico do Maio não pretende, de forma alguma, significar que os grandes desafios desta ilha se esgotam nessa actividade, mas apenas advogar que a comunidade maiense pode ter, de facto, nela uma possibilidade de desenvolvimento sustentado.

Por outras palavras, acreditamos que os problemas de formação profissional, da organização da actividade agrícola e pecuária, do abastecimento de bens à ilha, deverão ser equacionados em ligação estreita com as possibilidades (ou mesmo as certezas) do desenvolvimento turístico. A perspectiva nunca deverá ser a de equacionar tais problemas reais para satisfazer necessidades de desenvolvimento turístico, mas sim a de articular as respostas às várias necessidades reais de modo a potenciarem-se mutuamente. Sabemos também que, para o ajuste desta totalidade, para que tal ideal do todo seja possível, é necessário que essa visão seja, de facto, assumida e operacionalizada através de políticas dirigidas aos diversos sectores particulares.

Caros amigos,

Temos consciência de que uma das grandes limitações com que a ilha se debate há muito é a grande precariedade das ligações marítimas que assume proporção quase catastrófica quando a elas se juntam dificuldades de ligação aérea, como aconteceu recentemente em razão de condições meteorológicas adversas ou aquando das obras da pista do Maio.

Refiro-me às ligações aéreas porque, quando estas são inviabilizadas, a ilha fica quase literalmente isolada, marginalizada. Mas, em termos do transporte de pessoas, mercadorias e outros bens, sem descurar ambiciosos projectos da área dos transportes, a tónica tem de ser colocada no transporte marítimo, único capaz de assegurar a complementaridade entre as ilhas do Maio e de Santiago.

O dia-a-dia das pessoas, das famílias, das donas de casa, dos proprietários de hotéis, pensões, restaurantes, dos empresários e investidores fica seriamente comprometido pela precariedade e imprevisibilidade do transporte marítimo. Estimulamos a resolução definitiva, eventualmente faseada e o mais rapidamente possível desta ingente questão, pois como facilmente se apercebe, os transtornos advenientes desta situação não devem ser negligenciados.

Minhas Senhoras e meus senhores,

 A ligação marítima do Maio com o resto do país é uma tarefa urgente. O seu desenvolvimento continuará seriamente hipotecado se não se equacionar a questão do porto. Seguramente a solução reclamará tempo e recursos, mas ele é crucial para o aproveitamento das potencialidades de desenvolvimento da ilha.

Não será exagerado afirmar que essa infraestrutura é vital para uma verdadeira circulação de pessoas e bens, nomeadamente, em direcção à ilha de Santiago, pois para além da disponibilização de barcos adequados para fazer ligações regulares, é decisivo que se criem condições para que essa circulação se faça em condições de segurança para as pessoas e para todo o tipo de cargas que o desenvolvimento da ilha reclama.

Sabe-se que potenciais investidores aguardam definições claras a esse respeito para decidirem sobre a colocação dos seus recursos nesta ilha. Não duvidamos que se trata de decisões nada fáceis, pois a sua concretização pode exigir avultados meios financeiros num contexto em que estes não abundam. Mas os alicerces do desenvolvimento sustentável são, e serão sempre, opções assertivas e inteligentes, das quais não nos podemos desviar.   

Minhas senhoras e meus senhores,

É mais do que evidente que, se o processo de desenvolvimento do Maio terá reflexos em todo o país, não o será menos que ele só será viável se ocorrer num quadro político-institucional que garanta, a um tempo, a autonomia da ilha e do concelho e a sua harmoniosa articulação com o resto do país.

Essa harmonia reclama a conjugação, tão perfeita quanto possível, de políticas e de instituições capazes de maximizar os recursos e as potencialidades disponíveis. Neste momento, ainda que de forma embrionária, ocorrem em todo lado reflexões sobre a descentralização e a regionalização. Os munícipes e as autoridades maienses devem participar desse movimento para que as virtualidades desses processos possam ser postos ao serviço da ilha e das pessoas, evitando a duplicação de intervenções, a ineficiência de medidas desarticuladas, que podem comprometer o desenvolvimento e limitar o alargamento e aprofundamento da democracia.

Apenas modelos que de facto garantam que o poder local, com legitimidade democrática, tenha os instrumentos e recursos para, de modo adequado, responder às necessidades locais e assegurar uma articulação solidária com os poderes central e infra-municipal, e possíveis estruturas regionais, permitirão um aproveitamento cabal das potencialidades existentes e responder aos grandes desafios que se colocam ao país e aos cidadãos.

Minhas senhoras e meus senhores,

Uma das grandes conquistas de Cabo Verde é, sem dúvida, a institucionalização do poder local autónomo e democrático. Um poder saído da vontade popular expressa nas urnas e que tem por missão primeira participar na resolução dos problemas das pessoas e da sua assunção como agentes e beneficiários do desenvolvimento social, económico e cultural do país.

A ilha do Maio não é alheia a este processo mas, seguramente, a disponibilização de mais recursos muito ajudaria no equacionamento de problemas importantes que ultrapassam a capacidade das autarquias. Por isso, como Presidente da República, vejo com satisfação e reafirmo o meu apoio à disposição do Governo de aumentar a participação dos Municípios no Fundo de Financiamento Municipal e manifesto o desejo de que essa participação seja ainda maior assim que as condições o permitirem.

Caros munícipes, prezados amigos,

Apesar dos avanços verificados nesta ilha, não podemos ignorar que subsistem importantes problemas como o desemprego, nomeadamente no seio da juventude, dificuldades nos sectores das pescas, agricultura e pecuária e problemas no acesso ao ensino superior.

Ainda que boa parte desses problemas seja de âmbito nacional, têm, naturalmente, contornos próprios de uma ilha que, de entre outras características específicas, tem uma população reduzida.

Esperamos nestes dois dias de contactos com as autoridades e com as mulheres e homens, jovens desta bela ilha ficar muito melhor habilitados para, nos termos das nossas atribuições, contribuir para a resolução desses e de outros problemas que afligem as suas gentes.

Agradeço, desde já, a calorosa recepção que me foi reservada e as generosas e simpáticas palavras que me foram dirigidas pelos líderes das bancadas, pela Presidente da Assembleia Municipal e pelo Presidente da Câmara Municipal e reconheço que a proverbial simpatia, delicadeza e fidalguia das gentes desta ilha, consubstanciadas no sorriso do Maio, estampado em rostos tão bonitos e acolhedores, já me contagiaram e me obrigam ao compromisso de retribuir com igual afecto e muito empenho na resolução dos problemas desta terra.

Muito obrigado.

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