Exmo. Sr. Presidente da Camara Municipal
da Brava,
Exmo Senhor Presidente da Assembleia
Municipal da Brava,Exmos Senhores Juiz e Procurador da República da Comarca da Brava,
Exmas Autoridades Civis, Militares e Religiosas,
Minhas Senhoras, meus Senhores,
População da Brava,
Caríssimos Amigos,
Primeiramente queria, de forma, muito
sincera, agradecer as generosas palavras que me foram dirigidas, neste meu
retorno a casa. Palavras que, aliás, se inscrevem no fraternal acolhimento
morabi desta terra de que tanto eu como os meus colaboradores têm vindo a
beneficiar desde que chegámos à furna anteontem à noite. Foi assim também ontem
no memorável encontro com as forças vivas da ilha no auditório.
Com esta deslocação à brava, inicio a
minha “primeira visita a cabo verde”. Na realidade esta é a primeira vez que
deixo o palácio da presidência com o objectivo expresso de me dirigir às
comunidades, de ir ao encontro dos cabo-verdianos, de todos os cabo-verdianos,
na qualidade de presidente da Republica.
Até agora participei no palácio ou fora
dele de importantes cerimónias oficiais, mas a partir de hoje inicio uma
caminhada que durará aproximadamente cinco anos ao centro das preocupações dos
nossos compatriotas espalhados pelos quatro cantos do mundo mas que têm como
referencia a extensão física e cultural que vai da brava a santo antão.
É desta simbólica ponta da nossa terra
que me dirijo a todos os que neste país e em todo o mundo constroem a nossa
pátria, edificam o nosso país, engrandecem cabo verde.
No passado dia nove de setembro assumi,
na cidade da praia de santa maria, capital da republica, formalmente as funções
de presidente da republica, oportunidade que aproveitei para, dirigindo-me aos
cabo-verdianos e aos parceiros de desenvolvimento e amigos de cabo verde,
informar acerca do meu pensamento relativamente aos diferentes aspectos da vida
do país e sobre o modo como pretendo, em ligação com os outros órgãos de
soberania, mas sobretudo, com os cabo-verdianos de todos os quadrantes
políticos, participar da exaltante tarefa de busca da felicidade para todos.
Da capital falei ao mundo. Da cidade de nova sintra falo de novo ao mundo mas mais directamente ao nosso mundo, aos cabo-verdianos residentes no país e no estrangeiro. Ao falar-lhes, exercito um dos compromissos então assumidos, qual seja a de dialogar permanentemente com as pessoas, directamente ou através dos seus órgãos representativos. Falo para reiterar os compromissos então solenemente assumidos, especialmente o de fazer tudo o que estiver ao meu alcance para que as aspirações dos homens e mulheres que carregam este país sejam realidade.
Como sabeis não cabe ao presidente conceber e efectivar políticas públicas nas diferentes áreas de actividade. Esta incumbência é da responsabilidade do governo legítimo do país que, através do seu programa, procura encontrar as melhores soluções para os problemas de todos.
Ao presidente cabe avaliar, apoiar,
incentivar, criticar ou aplaudir as soluções preconizadas e, sempre que
possível, apontar caminhos que possam ser os mais apropriados aos interesses do
país.
Para que esse papel possa ser
adequadamente assumido, o presidente não pode ater-se apenas aos seus conceitos
e ideias. Para além destes, tem de ouvir e ponderar os diferentes argumentos do
governo mas sobretudo auscultar a sociedade.
Esta primeira visita situa-se nesta
perspectiva, nessa linha de diálogo permanente com os agentes políticos e
sociais, e, sempre que possível, a partir de realidades concretas do país, de
suas instituições e da vida das pessoas. Apenas desta forma o presidente poderá
de facto ajudar de forma construtiva e crítica o executivo cabo-verdiano a
encontrar as melhores soluções nas diferentes áreas.
Apenas assim cabo verde sairá a ganhar
nas diferentes esferas. Por esta via o nosso país terá maiores possibilidades
de encontrar as respostas mais adequadas, justas e eficazes nos domínios da economia
e do emprego, da educação, da diplomacia ou da promoção social.
Minhas senhoras e meus senhores,
caros amigos,
Há pouco mais de um mês o país iniciou
uma nova era em termos de relacionamento politico, caracterizado pelo facto de
pela primeira vez o governo e o presidente não serem originários da mesma área
politica.
Como sabeis o povo decidiu que a gestão política
do país passasse a contar com uma relação de chamada coabitação. Trata-se de
uma realidade completamente nova entre nós, mas como assinalei, prenhe de
possibilidades: um governo que emana de resultados claros de eleições
legislativas e um presidente também legitimado por expressivo voto popular. O
facto, normal em democracia, de serem originários de áreas politicas
diferentes, longe de representar uma limitação, pode, desde que bem
compreendido, aceite e aproveitado, constituir uma grande vantagem pois permite
que a realidade possa ser encarada de prismas diferentes e por isso de forma
mais rica.
Ainda que esta nova realidade tenha muto pouco tempo de existência, que a experiencia seja muito recente e por isso seja muito cedo para se fazer qualquer balanço, acredito firmemente nas suas potencialidades e que creio que, se bem potenciadas, poderão ser uma mais valia para todos.
No que me diz respeito, confesso que
estes primeiros tempos têm sido de uma aprendizagem muito positiva, e têm
contribuído para reforçar a convicção de que esta é uma via a ser plenamente
explorada
Tudo continuarei a fazer para que esta
relação seja a mais proveitosa possível para o país e para os cabo-verdianos.
Minhas senhoras e meus senhores,
O mundo enfrenta hoje uma crise
financeira sem precedentes e que naturalmente tem repercussões entre nós. Boa
parte dos nossos parceiros de desenvolvimento encontra-se em situação de
dificuldades às quais naturalmente não somos imunes. As repercussões poderão
ocorrer ao nível dos investimentos e do emprego, com reflexos negativos na área
social. Igualmente a situação afecta negativamente as nossas comunidades
emigradas, pois grande parte dos países de acolhimento estão sendo afectados
pela crise.
A situação não é boa mas seguramente não
é desesperadora. Para além das medidas que certamente serão adoptadas, tendo em
vista amortecer e atenuar os impactos negativos especialmente junto dos mais
desprotegidos, é necessário aprimorar o espírito de solidariedade social,
particularmente nas ilhas em que o ano agrícola ficou aquém das expectativas.
Através de intervenções apropriadas a
partir dos pertinentes diagnósticos que os órgãos competentes não deixarão de
realizar, estou seguro de que as medidas apropriadas, especialmente as
dirigidas aos mais carenciados, serão tomadas.
Naturalmente que as grandes preocupações
de ordem económica e social não nos devem fazer perder de vista a vertente
cultural da nossa realidade. É através da cultura que a singularidade
cabo-verdiana se afirma, que a nossa existência no mundo adquire sentido, até
porque ela acaba por ser a síntese criativa de todas as dimensões da vida.
Inspirado na grandeza, originalidade e
universalidade de Eugénio Tavares, continuarei, na qualidade de presidente da
república e de cabo-verdiano amante da nossa cultura, atento a todas as grandes
manifestações culturais, incentivando os criadores e promotores culturais e
apoiando as politicas adequadas para o sector.
Minhas senhoras e meus senhores,
Caros Bravenses,
Porque iniciar a vista a cabo verde pela
ilha da brava? Porque começar pelo chão de Eugénio Tavares? Exactamente por ser
o chão de um dos esteios maiores da nossa cultura, cimento da nossa
cabo-verdianidade. Aqui uma parte essencial da nossa identidade foi e continua
a ser construída. Por isso faz todo o sentido iniciar a visita a cabo verde por
esta ilha.
Mas a brava também inscreve-se na perfeição
num conjunto de preocupações que estão sempre presentes na mente do presidente.
A nível nacional é provável que seja a ilha mais periférica do país. A brava
tem conhecido limitações no processo de desenvolvimento que ainda se
caracteriza por acentuadas assimetrias. Por isso tem todo o sentido começar por
aqui este processo de escuta, de diálogo, fundamental para que a contribuição
para o equacionamento e solução dos problemas assente na realidade das pessoas.
Esta parte do todo nacional tem
conhecido uma progressiva e acentuada redução da população, indicador que, por
si só, atesta que o processo de desenvolvimento, no concernente à ilha, merece
ser repensado. Que algo vai mal nesta ilha.
É provável que as grandes
potencialidades locais necessitem ser melhor aproveitadas, pois apenas assim a
população terá, para além de factores culturais e familiares, razões para
permanecer e fecundar o seu chão.
Seguramente não será uma tarefa fácil. É
provável que os esforços que as autoridades locais e centrais têm desenvolvido
nessa direcção necessitem ser intensificados de forma a poderem atrair
investimentos nomeadamente dos bravenses emigrados.
A área dos transportes marítimos, não
obstante o importante avanço que hoje permite uma ligação quase diária com a vizinha
ilha do fogo, continua a merecer atenção particular, nomeadamente em
determinadas épocas do ano.
Minhas Senhoras e meus Senhores,
Entendo que um sistema de transporte
marítimo regular, seguro e confortável tem uma dimensão estruturante para o
desenvolvimento sócio-económico da ilha e para a sua integração definitiva no
todo nacional.
Complementarmente os transportes aéreos
revelam-se fulcrais para o desenvolvimento da brava. O facto da construção de
um aeroporto ser tecnicamente viável, não obstante os investimentos que
exigirá, é muito importante.
Os esforços no sentido da concretização desse
importante sonho necessário, merecerão todo o apoio do presidente da republica,
que igualmente dedicará grande parte da sua atenção ao estímulo à construção de
um heliporto e à aquisição dos meios necessários ao socorro das pessoas em
situação de emergência.
Da resolução dessas importantes
questões, como da ampliação do cais depende em larga medida todo o processo de
desenvolvimento da ilha, numa perspectiva integrada com a vizinha ilha do
vulcão, particularmente se atentarmos para o facto de as características da
brava oferecerem condições muito especiais para o florescimento de um turismo
de qualidade e numa perspectiva solidária.
Acreditamos que todas autoridades
estarão empenhadas no equacionamento dessas importantes questões que são
fundamentais para atrair o investimento dos emigrantes bravenses e de outras
origens.
O preço da água, problema maior da
agricultura, e que afectará também o crescimento da hotelaria e restauração,
apesar de complexo, deve ser encarado de forma prioritária.
O sector das pescas, apesar de possuir
grandes potencialidades e de ser considerado muito importante para a ilha e,
eventualmente, para uma região em que esta se integre, conhece uma grande
retracção devido à desmotivação dos pescadores, cujo número vem decrescendo e à
obsolescência dos barcos, equipamentos e organização.
Pelos empregos que pode gerar, pela
demanda regional que pode atender e pelo impacto positivo na dieta alimentar,
essa actividade deve merecer uma atenção particular e mais cuidada.
Ainda que não muito numerosa, a
juventude da ilha vem enfrentado problemas que espero melhor conhecer durante a
minha estadia na ilha e muito particularmente através do diálogo directo que
travarei esta tarde com os jovens.
Contudo, preocupa-me a problemática da
formação profissional local bem como as questões relacionadas com o uso de
substâncias psicoativas que devem ser encaradas com determinação, sempre nas
perspectivas preventiva e de tratamento.
Minhas senhoras e meus senhores,
Como cantou o grande Eugénio Tavares,”
si ca bado ca ta birado”. Sim, vim a esta ilha, comecei por esta emblemática
ponta sul de cabo verde, o meu périplo ao coração do país, de onde não pretendo
sair, para poder ter o pretexto do regresso, seguramente não para verificar a
resolução definitiva dos seus inúmeros problemas. Virei bem antes, para
testemunhar a possível realização de algo que defendo com todas as minas energias:
a elaboração de um plano de desenvolvimento da brava, integrado na região a que
pertence e que dê corpo a um processo de discriminação positiva de uma das
parcelas injustamente mais esquecidas de cabo verde. Forma que traduziria
seguramente a efectivação do que defendi ao longo de toda a minha acção
enquanto candidato presidencial: a realização do princípio – com guarida
constitucional – de igualde de oportunidades entre toadas as ilhas, concelhos e
regiões do país.
Como disse noutra ocasião e noutras circunstâncias, não pode haver uma fatalidade, qual seja a de a ilha não poder deixar de ser a brava ilha da solidão.
Muito obrigado a todos.
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