Senhor Presidente do Tribunal de Recurso
de Timor Leste,
Senhor Presidente do Tribunal
Constitucional de São Tomé e Príncipe,
Senhora Presidente do Conselho Superior
de Magistratura Judicial,
Senhores Juízes Conselheiros do Tribunal
Constitucional de Angola,
Senhores Juízes Conselheiros do Conselho
Constitucional Moçambique,
Senhoras e Senhores Deputados da Nação,
Senhoras e Senhores Magistrados
Judiciais e do Ministério Público,
Senhoras e Senhores conferencistas,
moderadores, relatores e facilitadores,
Senhoras e Senhores Representantes e
Membros das CNE,
Senhoras e Senhores Membros do corpo
diplomático,
Senhora Encarregada de Negócios da União
Europeia,
Senhor Presidente da Fundação Direito e
Justiça,
Senhor Presidente do Instituto Superior
de Ciências Jurídicas e Sociais,
Senhoras e Senhores Professores,
Senhoras e Senhores profissionais da
comunicação social,
Ilustres convidados,
Minhas senhoras e meus senhores,
As minhas primeiras palavras são de
felicitação aos promotores desta importante Conferência sobre o Contencioso,
Justiça e Conflito Eleitoral nos PALOP e Timor – Leste, e de agradecimento por
terem associado o meu nome a este evento que reúne personalidades tão ilustres
quanto competentes e que se inscreve num projecto mais amplo que tem por
objectivo o reforço da governação democrática, através do aproveitamento das
sinergias proporcionadas pela cooperação sul-sul.
Permitam-me, minhas senhoras e meus
senhores, destacar aqui e agora a figura do Sr. Presidente do Supremo Tribunal
de Justiça de Cabo Verde, Dr. Arlindo Almeida, que, com denodo, desenvolveu
todos os esforços para que este evento, subordinado a um tema de pertinência
vital para todo o sistema democrático, e muito especialmente para os nossos
países que ensaiam os primeiros passos nos trilhos da democracia, fosse, de
facto, realizado.
Antes de prosseguir queria, ainda,
destacar a feliz coincidência que consiste no facto de, poucos dias depois de
ter sido eleito para presidir a comunidade de Países Africanos de Língua
Oficial Portuguesa, em processo de revigoramento, estar a presidir a abertura
de um importante acontecimento que envolve os PALOP e Timor Leste.
Senhor Presidente do Supremo Tribunal de
Justiça,
Senhores Diplomatas,
Minhas senhoras e meus senhores,
Numa outra ocasião referi o facto de
algumas ideias traduzirem com uma abrangência tão grande determinadas épocas,
certas circunstâncias, momentos particulares da história dos povos ou mesmo do
mundo, que praticamente consubstanciam de modo quase totalizante esses espaços
e esses tempos.
A Democracia, ao lado de outras como
globalização e crise, inscreve-se nesse grupo de ideias, com a particularidade
de ser praticamente permanente. Ao longo de décadas esta expressão tornou-se
obrigatória, mesmo nas circunstâncias em que a realidade colidia de forma
dramática com os elementos básicos que enformam o conceito.
Porém, nos tempos mais recentes
assiste-se a uma mudança importante. Já não basta uma declaração de princípio,
um voto piedoso nas virtudes da democracia, para que os regimes se sintam
legitimados.
Actualmente existe uma grande pressão
para que um determinado número de requisitos seja cumprido, certas normas
observadas e determinadas condutas comprovadas para que um regime seja
considerado verdadeiramente democrático e, por causa disso, beneficie de certos
tipos de reconhecimento.
O que explicaria tal mudança? Porque
antes se convivia mais ou menos pacificamente com regimes ditatoriais,
profundamente desumanos, como o do apartheid ou o colonial, sem essa grande
pressão, sem a preocupação de pôr a questão da democracia ou dos direitos humanos
na ordem do dia?
Entre outras razões, nomeadamente
económicas, poderemos referir – nos às grandes transformações por que passa o
mundo, entre as quais as quase infinitas possibilidades comunicacionais que
permitem a milhões de pessoas verem-se, sentirem-se, comunicarem entre si e,
sobretudo, fazerem comparações.
Hoje a informação circula com uma
rapidez inimaginável há poucas décadas e as fronteiras físicas, culturais,
económicas e políticas esbatem-se, permitindo que o modo como as sociedades
estão ou podem ser organizadas seja do conhecimento de todos.
Já não basta dizer que o regime é
democrático, com ou sem adjectivação. Os cidadãos, no dia-a-dia, verificam que
as coisas podem ser diferentes. O contágio é inevitável, como atesta a
Primavera árabe. As forças democráticas ganham terreno e os decisores procuram
adaptar-se às transformações em curso, às exigências crescentes.
Senhor Presidente do Supremo Tribunal de
Justiça,
Minhas senhoras e meus senhores,
O mundo democratizou-se? A democracia implantou-se
definitivamente? A máxima “um homem um voto” universalizou-se de forma
irreversível?
Não. A realidade é bem mais complexa e a
democracia é um processo que, partindo de alguns elementos fundamentais,
irredutíveis, diria, vai-se aprimorando, vai-se adaptando.
Hoje o sistema democrático conhece,
mesmo nos países de democracia consolidada, alguns impasses, suscita dúvidas e
interrogações. Um número crescente de cidadãos não se reconhece no sistema
representativo em vigor, o que leva a que segmentos crescentes de cidadãos se
distanciem dos pleitos eleitorais, conduzindo a situações em que os principais
órgãos de direcção do país são, amiúde, escolhidos por um número relativamente
reduzido de cidadãos. É a democracia privando-se do seu elemento fundante que é
a participação das pessoas.
Nestas circunstâncias, as manipulações, motivadas
por solidariedades regional, cultural ou étnica são reais, e distorções de
questões essenciais uma possibilidade concreta, particularmente quando, para
além da limitação acima referida, as condições de vida de boa parte dos
eleitores, em termos de educação, emprego, nutrição e saúde, são muito
precárias, tornando-os vulneráveis. Sabemos disso até por experiência própria.
As limitações inerentes às experiências democráticas
têm, inclusivamente, revigorado o debate em torno da relação entre democracia e
desenvolvimento económico equitativo, propondo reflectir a relação entre
democracia, cidadania e justiça social.
Como consolidar democracias ainda frágeis, num
quadro de contínua e funda pobreza, e consideráveis níveis de desigualdades e
de exclusão social?
Minhas senhoras e meus senhores,
Nestas circunstâncias a disputa
eleitoral pode assumir o aspecto de mero ritual que tem por objectivo legitimar
o poder dos que sempre dele se serviram e não de uma ferramenta ao serviço dos
eleitores para melhor e livremente escolherem os seus representantes.
Fica claro que a democratização muitas
vezes é quase exclusivamente formal, não passando de alterações na
Constituição, elaboração de leis específicas para lidar com as diferentes
etapas, a criação de estruturas para gerir todo o sistema, sem qualquer impacto
real na vida das pessoas.
Deve-se, então, concluir que, com tantas
limitações, a democratização recente de muitos países não tem sentido? Deve-se
concluir que, em razão de um sem número de conflitos a que não-aceitação dos
resultados eleitorais conduz, as eleições provocam mais mal do que bem em
vários países?
Como facilmente se compreende, a
resposta para um processo tão complexo não pode ser fácil, pois ele não é
linear, sendo condicionado por um grande número de factores. Como se referiu a
democracia não é um processo acabado e muito menos estático.
Como se afirmou, as possibilidades de
manipulação são reais, os riscos de legitimação de regimes opressores são
concretos, bem como as hipóteses de desencanto com o próprio sistema
democrático.
Por todas essas razões não se pode
considerar que o processo de democratização em curso em várias regiões,
nomeadamente no continente africano, não tem razão de ser ou que não seja
positivo.
Pensamos que deve prosseguir, pois até
agora não se descobriu sistema político melhor do que o democrático, posição
que não deve ser entendida como acrítica de modelos que foram testados em
contextos políticos, culturais e históricos bem diferentes. Pelo contrário,
entendemos que um exercício permanente de recriação da democracia nos contextos
específicos deve ser constante preocupação. Não se trata da absolutização de
determinadas características, em busca de uma originalidade paralisante, como
pretendem alguns, mas da procura de equilíbrios entre princípios universais e
realidades particulares.
No quadro destes complexos problemas que
papel cabe aos que, como nós nos nossos países, têm responsabilidades directas
ou indirectas na consolidação da democracia? Entendemos que, antes de mais,
temos de assumir o grande compromisso de proceder ao aprimoramento permanente
do sistema, ao nível do seu aperfeiçoamento legal e institucional.
É neste âmbito que as actividades
preconizadas no quadro do projecto, de reforço da governação democrática nos
PALOP e Timor Leste, apoiado pela União Europeia, geram e justificam a grande
expectativa no sentido de que os seus resultados serão uma importante
mais-valia para as nossas democracias.
Aliás, a metodologia adoptada na
preparação das actividades e a proposta para a sua realização vão de encontro à
preocupação de equacionar problemas prioritários realmente existentes num
quadro mais amplo de reforço do sistema eleitoral.
Igualmente o facto de, apesar de se
reconhecer a existência de importantes pontos de convergência entre os
diferentes sistemas e, simultaneamente, levar-se em conta as especificidades
locais, nomeadamente através do estudo de casos, permitirá aos participantes
compreender a sua realidade e, eventualmente, encontrar ou rejeitar soluções já
testadas em outros cenários.
Senhor Presidente do Supremo Tribunal de
Justiça,
Minhas senhoras e meus senhores,
Todas as reformas que os nossos países
vêm fazendo no âmbito eleitoral têm sido na busca da melhor solução possível
para os respectivos processos eleitorais e isso deve ser devidamente
valorizado. É que não devemos nunca perder de vista que as decisões que cada um
dos nossos países toma, nesse e em outros âmbitos, vão sempre no sentido do
aperfeiçoamento dos nossos sistemas. Um sistema eleitoral perfeito é o sonho de
qualquer democracia, mas infelizmente não existem sistemas eleitorais
perfeitos.
Muitas vezes ouvimos, até com alguma
surpresa, críticas contundentes a sistema eleitorais de países com longa tradição
democrática, pondo em causa regras e soluções com séculos de existência, numa
procura constante de fazer corresponder de forma perfeita os resultados à
vontade dos eleitores. Deve ser essa a preocupação essencial, sem descurarmos,
naturalmente, que o sistema eleitoral também alberga outros valores que, no
limite, geram zonas de conflitualidade com esse valor primacial, o da vontade
popular expressa nas urnas.
Efectivamente, a estabilidade
governativa é um valor do nosso mundo moderno, reflectido em vários sistemas
eleitorais que, algumas vezes, consente alguns sacrifícios na representação
proporcional pura, corolário lógico da expressão perfeita da vontade popular.
Mas a segurança eleitoral também é um outro valor, alguma vez conflituante, no
limite, com a própria verdade eleitoral dada pela expressão aritmética dos
votos nas urnas.
Na verdade, sem deixar de acentuar o
valor cimeiro da verdade eleitoral, pois que ela é a expressão típica da
vontade popular, não podemos deixar de reconhecer que a procura da verdade
eleitoral como um valor absoluto pode conduzir a posições extremadas que podem
pôr em causa os princípios de segurança, de estabilidade e de aquisição
eleitorais. São também valores importantes do sistema que não podem ser
negligenciados.
Buscamos, todos nós pois, um sistema que
possa corresponder com a maior fidelidade possível a vontade dos cidadãos
eleitores.
É justa e pertinente a profunda
preocupação que os nossos países têm manifestado em relação ao sistema
eleitoral. Estamos, pois, a tratar de questões nucleares da democracia, do tal
«expediente técnico», no dizer de uma famoso politólogo, que permite mudar de
governo sem derramamento de sangue. Estamos a lidar, deste modo, com a
alternância política, com os mecanismos institucionais de exercício da
soberania popular, de acesso ao poder, dando corpo a representação da vontade
maioritária do povo.
A estabilidade política depende muito,
particularmente no nosso continente, da justeza do sistema eleitoral, sistema
no qual os principais actores políticos se revejam e que assegure, para além de
qualquer dúvida razoável, que os resultados eleitorais têm a máxima
correspondência possível com a vontade da maioria, livremente expressa nas
urnas. Sistema que procure tendencialmente rejeitar os fenómenos que perturbam
a comunicação eleitoral livre, entre os candidatos e os eleitores, que fazem
ressaltar o espectáculo em detrimento do projecto, o folclore em vez da
substância, o consumismo fácil em vez do debate de ideias.
Percorremos já um caminho e introduzimos
melhorias significativas no nosso sistema eleitoral. Os actores políticos estão
de parabéns, pois hoje a nossa lei eleitoral é inquestionavelmente melhor e tem
respondido com um grau razoável de eficácia aos desafios que vamos enfrentando.
Na verdade, Cabo Verde encetou reformas
significativas no seu sistema eleitoral, desde o desfasamento entre as eleições
legislativas e presidenciais, evitando a chamada contaminação destas últimas, o
alargamento dos círculos eleitorais com a consagração da coincidência entre a
ilha e o círculo eleitoral, com uma única excepção, a proibição de espectáculos
e de distribuição de materiais com fins utilitários durante a campanha
eleitoral, com a proibição de cerimónias de inauguração e de lançamento de
primeiras pedras no período eleitoral, o reforço da autonomia dos órgãos de
administração eleitoral e do princípio de isenção e imparcialidade das agentes
e órgãos de poder público.
Em todo o caso, podemos ainda fazer mais
e melhor. Na verdade, em cada grande decisão que se toma não pesam apenas a
qualidade das soluções disponíveis no momento: assumir uma decisão é, no mais
das vezes, ter de optar não pela solução ideal ou perfeita, mas pela solução
exequível, tendo em conta a nossa realidade: o nosso estádio de
desenvolvimento, os recursos humanos, financeiros e tecnológicos instalados, os
elementos de cultura prevalecentes, a abertura constitucional, e outros
elementos.
Prezados amigos,
Todos os presentes têm ideia do que
funciona bem e do que não funciona da melhor forma nos respectivos países.
Todos já terão dado um olhar ao que se faz no país vizinho. Um estudo comparado
dos quadros normativos que regem o sistema eleitoral nos países amigos terá
sido, em algum momento, ensaiado. E é bom que isso tudo seja assim. É assim que
consolidamos o conhecimento de onde nos encontramos e para onde queremos ir. E
seria óptimo que este fórum pudesse ajudar-nos a identificar os caminhos para
irmos de onde estamos para onde queremos ir. E que abrisse um espaço de troca
permanente de ideias, para que os contactos aqui estabelecidos se mantenham.
Afinal, vivemos na era das Tecnologias de Informação e Comunicação.
Neste domínio, aliás, é ingente buscar
conhecer o que, em termos de plataformas informáticas, existe e seja compatível
com as demais plataformas instaladas nos nossos respectivos países e que possa
contribuir para melhorar as respostas às questões postas pela necessidade de
inovação.
É imaginável o que se poupa em energia e em tempo com um sistema eleitoral onde
as coisas fluem, porque foram feitos os investimentos que se impunham. O
acontecido nas nossas últimas eleições locais ilustra a necessidade de inovação
nos sistemas de captação de votos e de apuramento dos resultados das eleições.
Mas, mais do que isso, os últimos
episódios também serviram para, uma vez mais, reconhecermos a urgente
necessidade de se libertar o nosso Supremo Tribunal de Justiça – órgão superior
da hierarquia dos tribunais judiciais, administrativos, fiscais e aduaneiros –
da responsabilidade de dirimir conflitos eleitorais e de se criarem as
condições para a instalação de uma jurisdição autónoma encarregada de lidar com
questões dessa natureza, o Tribunal Constitucional, tal como desenhado desde
1999 na Constituição da República. A instalação do Tribunal
Constitucional constitui uma exigência e um objectivo em relação ao qual temos
de trabalhar com determinação, considerando ser este um instrumento central
para a garantia da eficácia da Lei Fundamental da nossa República e para a
protecção dos direitos fundamentais dos cidadãos, entre os quais o próprio direito
de acesso aos órgãos e meios processuais eleitorais, e sobremaneira, no
contexto concreto do nosso estádio de desenvolvimento político, para a
afirmação crescente de uma cultura constitucional.
É muito salutar ter um sistema baseado
nos princípios mais avançados mas se eles não tiverem uma tradução prática
adequada, ele fica comprometido. É por isso que aos responsáveis compete tudo
fazer para que, na medida do possível, a prática traduza as opções formais e
procedimentais e seja eficiente. O cidadão tem que ter a percepção de que o
sistema respeita, defende e assume os princípios que o enformam. Esse
desiderato só pode ser atingido se existir uma articulação forte e coerente
entre os pressupostos legais e organizacionais e a intervenção concreta.
Se nas disputas eleitorais, o que
aparentemente conta, no final, é a contagem dos votos, um dos grandes riscos
que se tem corrido em processos eleitorais, muitas vezes com consequências
nefastas, é o não reconhecimento por parte dos derrotados dos resultados
eleitorais, muitas vezes na base da falta de credibilidade, justificada ou não,
de órgãos responsáveis pela gestão de tais situações.
É evidente que o processo não se resume a
esse aspecto, mas sendo um dos mais sensíveis e em relação ao qual se
diagnosticaram limitações, nada mais avisado do que lhe conceder a importância
de que se reveste no quadro do sistema eleitoral, levando em devida conta,
igualmente, a necessidade de se estar atento perante certas tentações,
frequentes em circunstâncias de confrontação ou de descrença, de se ensaiar
“fugas em frente” em matéria legislativa, ou mesmo de uma certa disposição à
adopção de soluções “ad hoc” ou de
«moda», atraentes, que careceriam de maior e melhor ponderação, senão mesmo de
soluções «mágicas», legislativas ou outras, que poderão até redundar em efeitos
completamente contraproducentes.
A nossa aposta deve, portanto, ser no
sentido de um amplo conhecimento do que de melhor existe, se faz e se segue
construindo no mundo e no nosso tempo, de modo a municiar da melhor forma
possível os nossos processos de reforma, paralelamente ao estímulo ao que
chamamos de uma cultura constitucional que possa envolver os cidadãos,
individualmente ou como colectividade, os titulares dos cargos políticos e os
próprios agentes da justiça. Mas mister se revela ter sempre presente uma
atitude de lucidez, de serenidade e de avaliação crítica do que temos e do que
nos é oferecido.
Senhor Presidente do Supremo Tribunal de
Justiça,
Minhas senhoras e meus senhores,
Nos nossos países, a nossa aprendizagem
e experiência democrática têm sido diferenciadas. Ainda que todos tenhamos sido
colónias portuguesas, iniciado os processos democráticos há relativamente pouco
tempo e de os nossos sistemas terem uma matriz semelhante, as nossas realidades
são diferentes.
Os nossos propósitos e objectivos são
comuns e existem fortíssimas ligações históricas políticas e culturais entre
nós, para além da circunstância de no pós independência terem sido implantados
nos nossos países regimes de partido único, circunstância que condiciona
necessariamente a prática política.
Contudo, há que ter em conta que as
nossas realidades humanas são diferenciadas em termos numéricos e de composição
e que os processos independentistas conheceram caminhos diferentes que,
naturalmente, também influenciaram os processos pós independência.
Em relação a este aspecto há que
destacar, antes do mais, o facto de quase todos os nossos países terem sido
palco de luta armada que em alguns casos opôs movimentos independentistas a
forças coloniais e em outros confrontos violentos também opuseram organizações
autóctones. Apenas dois países, por sinal ilhéus e de pequenas dimensões, não
conheceram, no seu solo, a luta armada.
Se é facto que a realidade da guerra,
por vezes inevitável, particularmente quando relativamente longa, deixa marcas
que apenas com o tempo se desvanecerão, quando ela envolve protagonistas locais
a situação fica mais complexa, pois assiste-se a uma quase legitimação da
violência enquanto instrumento de gestão de conflitos ou de acesso ao poder.
A interiorização dos princípios de
tolerância, da resolução pacífica dos conflitos, da aceitação e respeito pelo
diferente, que enformam a Cultura da Paz, representa uma autêntica revolução
pois implica a substituição da arma pelo voto. O processo é complexo e não se
pode esperar milagres a curto prazo.
Trata-se de uma aprendizagem que terá de
levar o seu tempo. Mas aos responsáveis cabe tudo fazer para que este seja o
mais curto possível e que a cada momento seja feito o máximo, como este evento
está a demonstrá-lo. A experiência acumulada em outras paragens será sem
dúvidas de grande valia na consolidação do processo democrático nos nossos
países.
Prezados amigos,
A democracia cabo-verdiana tem conhecido
sucesso efectivo mas, estamos cientes de que temos ainda um longo caminho a
percorrer na perspectiva do aprofundamento da cultura democrática, pilar
fundamental que assegurará a irreversibilidade do nosso sistema e do nosso
regime. Mas também podemos assegurar que, felizmente, longe estamos do que
poderíamos chamar «direito de necessidade de participação».
Acreditamos que este importante evento
que nestes três dias decorrerá em Cabo Verde, dirigido e participado por
eminentes e respeitados especialistas de nível internacional será de grande
importância para nós todos.
A terminar, Senhor Presidente do Supremo
Tribunal de Justiça, gostaria de deixar um apelo no sentido de, sem deixarem de
valorizar o que temos, sem partirmos todos à conquista do nosso sonho de
sistema eleitoral, sem perder de vista que, em cada etapa, somos, não raras
vezes, obrigados a assumir não a opção ideal, a perfeita, mas a possível, a
exequível, em função de nossas limitações. Mas que isto não nos conduza nunca à
frustração: o sonho deve manter-se intacto, renovável, à espera de uma situação
melhor, por cuja emergência devemos trabalhar com afinco e denodo. E também que
nunca, mas nunca, deveremos desbaratar os trunfos de que já dispomos, nem
confundir o acessório com o essencial.
Gostaria de saudar efusivamente os
organizadores desta conferência, dar as boas vindas aos que vieram de fora e
desejar-lhes uma boa e profícua estada entre nós.
A todos os participantes desejo votos de
uma proveitosa troca de experiências num processo de intercâmbio que, não tenho
dúvidas, será muito enriquecedor.
Declaro aberta a “Conferência Sobre o
Contencioso, Justiça & Conflito Eleitoral Nos Países Africanos de Língua
Oficial Portuguesa e Timor Leste”…
Muito obrigado.
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