Caros concidadãos
No momento em que
inicio funções como Presidente da República, quero saudar todos os meus
concidadãos, no país e na diáspora, os que votaram em mim e os que não o
fizeram. Discurso de investidura de sua excia. O senhor presidente eleito da
república de cabo verde, dr. Jorge carlos de almeida Fonseca
A todos quero
reafirmar o que disse ao longo da campanha eleitoral: serei o Presidente de
todos os cabo-verdianos e a todos valorizarei como cidadãos dignos desta terra,
que precisa do concurso de todos, de todos, sem excepção.
Cumprirei as minhas
funções como Presidente no estrito respeito pelo que estatui a Constituição da
República, que considero como o meu Caderno de Encargos, como é a vontade
maioritariamente expressa nas urnas pelos cidadãos cabo-verdianos.
O Manifesto Eleitoral
e o Pacto com a Nação que apresentei ao eleitorado, e que mereceram a confiança
dos eleitores, são para cumprir. E por isso, quero reafirmar solenemente
perante esta Assembleia e perante todos os que me escutam neste momento, o meu
firme engajamento com cada um dos compromissos eleitorais que assumí com o povo
cabo-verdiano.
Senhor Presidente da
Assembleia Nacional
Agradeço as palavras
que me dirigiu nesta que é a Casa da Democracia cabo-verdiana. Aqui é a
residência permanente e mais visível do pluralismo político e da democracia no
nosso país.
É nesta augusta e
simbólica instituição que está representado o nosso povo soberano. Por isso,
também aos Senhores deputados dirijo uma palavra especial nesta que é a
primeira vez que uso da palavra enquanto Presidente da República: a todos e a
cada um de vós a quem os cabo-verdianos confiaram um mandato de representação
política, quero assegurar todo o meu respeito institucional e a garantia de
total cooperação entre o órgão de soberania que integram e o Presidente da
República.
Ao senhor
Primeiro-ministro e ao Governo reafirmo o que expressei antes e durante a
campanha eleitoral. Vossas Excelências podem contar com o meu firme
envolvimento na resolução dos grandes problemas que o país enfrenta e com toda
a colaboração institucional que a Constituição possibilita e o país precisa. O
Governo terá em mim um interlocutor atento, aberto, disponível, que acompanhará
de forma permanente o processo e os resultados da governação.
Serei o árbitro do
sistema de poderes e farei tudo o que estiver ao meu alcance para moderar as
tensões da vida política, actuando como factor de equilíbrio do nosso sistema
de governação, como o exige a Constituição da República.
Só não farei os
impossíveis ou o que for rejeitado pelos superiores interesses nacionais,
sempre norteado e balizado pela Constituição, valendo aqui a singela ideia, que
me tem sido muito cara, de que nos estados constitucionais não há democracia
nem estado de direito fora da Constituição e muito menos contra ela.
Os partidos políticos,
verdadeiros esteios do nosso sistema democrático, terão no Presidente da
República um elemento de incentivo na sua decisiva missão de formadores da
vontade política plural dos cidadãos e de mobilizadores das energias
necessárias à realização dos objectivos nacionais. Igualmente serão estimulados
a, sem abdicarem da sua identidade político-ideológica, construir, quando
necessário, os consensos reclamados pelos processos de desenvolvimento e de
aprofundamento e extensão da nossa democracia. A estrita equidistância em
relação às diferentes forças políticas será um verdadeiro diapasão de toda a
intervenção do Chefe de Estado.
As organizações
sindicais, patronais ou profissionais, emanações naturais das diversas
actividades da sociedade, merecerão a melhor atenção do Presidente que também
manterá diálogo permanente com a sociedade civil organizada e com os cidadãos
residentes nas ilhas e na diáspora, com destaque para esse segmento da
população, prenhe de sonhos, desafios e entusiasmo que é a Juventude cabo-verdiana.
Pela sua
especificidade, muito particularmente pela sua grande proximidade relativamente
às pessoas e comunidades, e pelo seu potencial de aprofundamento e alargamento
da democracia, o poder local democrático será interlocutor muito privilegiado
do Presidente que, sempre que necessário e desejável, será o intermediário
entre ele e o poder central, contribuindo para que o relacionamento seja
saudável e baseado em critérios de justiça, legalidade, respeito mútuo,
não-discriminação e para que tenhamos no nosso país um poder local cada vez
mais autêntico, democrático e autónomo, ao serviço das populações.
Senhor Presidente da
Assembleia Nacional
Senhoras e Senhores
Deputados
Ilustres Convidados
Há momentos que
atravessam a vida das Nações, diríamos a definem. Momentos em que todas as
energias confluem para uma única causa, um objectivo, um grande desígnio.
Na história recente
do nosso país, a Independência foi um desses momentos, quando a Nação
cabo-verdiana se levantou em uníssono para resgatar a sua identidade, assumir a
sua autonomia enquanto Comunidade e reclamar a soberania sobre estas ilhas.
Quinze anos depois, o
segundo grande momento galvanizou a Nação cabo-verdiana, originando num movimento
político e social imparável em prol da liberdade e da democracia, que se
concretizou com as primeiras eleições pluralistas de 13 de Janeiro de 1991.
Foram dois momentos
paradigmáticos, dois momentos de que todos os cabo-verdianos podem justamente orgulhar-se.
Foram momentos de ruptura, conseguidos sem traumatismos excessivos, com a
dignidade e a perseverança que nos caracterizam como povo.
Ao longo destes
trinta e seis anos de Independência, os cabo-verdianos enfrentaram e venceram
inúmeros e complexos desafios. E estou seguro de que continuará na mesma senda.
Excelências,
Não constituirá
surpresa para ninguém afirmar que Cabo Verde tem pela frente momentos difíceis,
que, aliás, já estão presentes no dia-a-dia dos cidadãos. Tempos difíceis que
não nos devem desencorajar. Pelo contrário, é nos momentos de grande
dificuldade que a alma e a garra da Nação devem sobrepor-se aos obstáculos.
Soubemos, enquanto
Nação, levar de vencida enormes desafios que herdámos no momento da nossa
Independência.
Soubemos fazê-lo no
passado e saberemos dar a resposta adequada aos desafios presentes e futuros.
Os desafios actuais
são de ordem diferente dos que tivemos que vencer quando acedemos à
Independência. Por isso, as soluções têm que ser diferentes e adaptadas ao
contexto interno e externo prevalecentes neste momento.
A primeira exigência
para que saibamos encontrar soluções aos nossos problemas, situa-se ao nível do
diagnóstico. Temos que enfrentar a realidade tal como ela é e não como
desejaríamos que fosse. E devemos dar a conhecer essa realidade aos nossos
concidadãos para que tenham a consciência exacta da dimensão dos desafios que
temos pela frente.
Isso é tão mais
necessário quanto só um esforço colectivo de todos nos permitirá ultrapassar e
vencer as dificuldades actuais e, ainda mais importante, assegurar no longo
prazo um nível de vida digno a todos os cabo-verdianos.
A verdade pode por
vezes ser dura, mas é necessário que todos a conheçam. Acredito profundamente
que só assim poderemos mobilizar a sabedoria, as competências, a vontade
colectiva dos cabo-verdianos, o seu empenho no engrandecimento destas nossas
queridas ilhas.
Caros Concidadãos,
A realidade
cabo-verdiana actual mostra sinais mistos, com desenvolvimentos positivos e
outros negativos. A continuidade do crescimento económico, o desenvolvimento de
infra-estruturas físicas, a cobertura sanitária do país, o alargamento da
educação, as tecnologias de comunicação e informação, contam-se entre os sinais
positivos, sobre os quais é preciso construir.
Os sinais negativos
abarcam realidades hoje bem presentes no quotidiano dos cabo-verdianos: o
desemprego de uma grande franja da população jovem, a pobreza que ainda afecta
um considerável número de cabo-verdianos, níveis de insegurança que ultrapassam
o comunitariamente suportável, os problemas no abastecimento de água e energia
na capital e noutros centros urbanos, o endividamento do Estado, das empresas e
das famílias, que se aproxima de níveis de alerta, as dificuldades da gestão
orçamental, com o défice orçamental a níveis já irrazoáveis, a crise de valores
que ameaça corroer o próprio tecido social. O empresariado nacional enfrenta
sérias dificuldades. Acrescente-se, ainda, dois problemas cruciais para o
desenvolvimento futuro do nosso país: a qualidade insatisfatória global do
nosso sistema de ensino e o crescimento insuficiente da produtividade.
Esta realidade
nacional insere-se num contexto internacional que assume contornos
preocupantes, susceptíveis de influenciar negativamente o desempenho económico
do nosso país, altamente dependente dos fluxos financeiros externos e
vulnerável às vicissitudes da economia internacional
Excelências, Ilustres
Convidados
Nenhum desafio - para
além daquele mais geral e verdadeiro prius que se traduz na
preservação e reforço dos pilares fundamentais do estado de direito democrático
e que se reflecte na afirmação crescente e generalizada de uma cultura
democrática - se mostra tão importante e urgente quanto os do crescimento
acelerado da riqueza nacional e da redução das desigualdades
sociais.
Nos últimos trinta
anos, o crescimento real da economia cabo-verdiana foi de 6% ao ano, e o
crescimento da riqueza média por habitante foi de 4%, descontando os efeitos do
crescimento demográfico. Este resultado pode parecer excelente, mas
infelizmente não o suficiente para nos fazer sair efectivamente do
subdesenvolvimento. É preciso ir muito além dele, duplicá-lo mesmo, para que as
actuais gerações possam ainda beneficiar do desenvolvimento.
A nossa Nação tem a
inteligência e a vontade necessárias para vencer o subdesenvolvimento. Afinal,
é disso que se trata: vencer o subdesenvolvimento.
Ainda que a palavra
subdesenvolvimento gere hoje algumas reticências em favor de outras
politicamente mais correctas ou simpáticas, o importante é estarmos todos
conscientes de que, quaisquer que tenham sido os nossos sucessos, e tivemos
muitos, o que nos resta a fazer para atingir o tão almejado desenvolvimento é
tão importante, quiçá mais difícil, mas seguramente ao nosso alcance.
As dificuldades não
nos metem medo. Sabemos que a fasquia deve ser colocada bem alto.
Outros povos fizeram
o mesmo, colocando-a bem alto, e foram capazes de percorrer, nos últimos
quarenta anos do século vinte, o caminho estreito que conduz ao
desenvolvimento.
Tiveram a sabedoria
de conceber e executar as políticas certas nos momentos certos; souberam
aproveitar da melhor forma as oportunidades que as vicissitudes da economia
mundial, e a sorte, colocaram no seu trajecto.
Cabo Verde está bem
colocado para ser um dos países com capacidade para vencer o subdesenvolvimento
na primeira metade do século vinte e um. E esse seria, digo será o terceiro
grande momento definidor da nossa história recente.
Quando,
orgulhosamente, pudermos afirmar perante nós mesmos e o mundo, que o nosso país
venceu a miséria e que nenhum cabo-verdiano vive desamparado na sua terra;
quando formos capazes de oferecer oportunidades de emprego a todos os que
queiram trabalhar; quando tivermos reduzido as desigualdades para níveis
aceitáveis, então nessa altura teremos cumprido a nossa missão para com as
gerações presentes e futuras.
Alguns dirão que são
sonhos irrealizáveis.
Estamos habituados a
esse discurso derrotista. Ouvimo-lo durante a luta pela Independência,
considerada um objectivo irrealista e irrealizável. Provámos que os derrotistas
estavam errados. Voltámos a escutar as mesmas vozes em relação ao objectivo
democracia e liberdade. Respondemos instalando em Cabo Verde um
regime democrático estável de que nos podemos orgulhar, apesar de sua
incompletude cultural e institucional.
Teremos de responder,
e responderemos seguramente da mesma maneira, aos dois grandes desafios do
desenvolvimento: o crescimento acelerado da economia e da riqueza nacional, e a
diminuição das desigualdades sociais irrazoáveis.
Estes são desígnios
nacionais que nos interpelam a todos, governantes, famílias, mundo empresarial
e sindical, organizações da sociedade civil, cidadãos.
Senhor Presidente da
Assembleia Nacional
Minhas Senhoras e
meus senhores
A afirmação e
credibilidade na cena internacional de um pequeno país como Cabo Verde é
tributária da definição e execução de uma política externa que tenha em
consideração os grandes valores universais, que também são nossos. A nossa
acção diplomática deve pois afirmar-se nos valores humanistas, de defesa e
promoção da democracia, da liberdade, do respeito pelos direitos humanos, e na
observância do direito internacional que pauta as relações entre Estados.
Enquanto Presidente
da República e no quadro constitucional existente promoverei e apoiarei o
Governo no fortalecimento e desenvolvimento das relações existentes entre Cabo
Verde e os seus principais parceiros de desenvolvimento, bem como na busca de
novos entendimentos e parcerias, designadamente com os chamados países
emergentes.
Saúdo os Governos de
países amigos e as organizações internacionais que desde a Independência têm
dado um contributo notável ao desenvolvimento do País, o que nos permitiu
atingir um patamar de desenvolvimento apreciável, tendo em conta os nossos
condicionalismos.
Manifesto a minha
disponibilidade para a continuação de uma política de boa vizinhança e de
promoção das relações com os países africanos e com as instâncias regionais de
que fazemos parte. Deveremos estar sempre de «corpo inteiro», assumindo os
nossos valores e os nossos princípios. Deveremos trabalhar para que se afirme
uma África do futuro onde triunfem, de forma generalizada, a liberdade, a democracia,
o respeito pelos direitos humanos e o bem-estar para todos.
Contribuirei de forma
activa para que as relações entre os países da CPLP se fortaleçam e desenvolvam
e para que a nossa Comunidade possa ser cada vez mais uma instituição em que os
nossos concidadãos se possam rever. Mais uma comunidade de povos do que uma
comunidade de Estados.
Darei atenção às
relações com os países do continente europeu, em particular os da União
Europeia no quadro da parceria especial, procurando maximizar as potencialidades
por ela oferecidas.
As relações com os
Estados Unidos da América devem constituir um vector importante da nossa
política externa, inclusivamente por albergarem a maior comunidade
cabo-verdiana no exterior de Cabo Verde. Os valores constitutivos desse grande
país, a liberdade individual, a democracia, o respeito pelos direitos dos
cidadãos, são também os nossos, e dele comungamos.
A China é hoje um
parceiro incontornável de Cabo Verde. Sempre reconhecemos a unidade da China e
entendemos desenvolver ao máximo as relações de parceria com esse país, cujo
peso internacional crescente reflecte a realidade do seu potencial económico.
Entendo que o aprofundamento das relações com a China é de grande interesse
para o nosso país, e trabalharei com o Governo para que essa parceria produza
os seus frutos no interesse de ambos os países.
Promoverei, no quadro
constitucional e no respeito estrito da legalidade, acções oportunas e
pertinentes para um eficaz combate à criminalidade internacional organizada,
nomeadamente, ao terrorismo e na luta contra o tráfico de drogas. Os parceiros
internacionais poderão contar com a nossa disponibilidade e todo o nosso
empenhamento para a criação de um clima de paz e estabilidade regional.
Senhor Presidente da
Assembleia Nacional
Senhoras e Senhores
Deputados
O crescimento
acelerado da economia é a pedra de toque, o objectivo intermédio que
determinará a nossa habilidade em vencer o subdesenvolvimento.
Na verdade, a
característica comum de todos os países que no século passado venceram o
subdesenvolvimento, e dos que neste século perseguem o mesmo objectivo, é o
facto de terem sido bem-sucedidos em fazer a economia crescer de forma
acelerada durante algumas décadas seguidas, num processo interactivo que lhes
permitiu melhorar o nível de vida e o bem-estar das suas populações, afinal o
grande objectivo do desenvolvimento.
Cabo Verde pode e
deve seguir o exemplo desses países.
Simples de dizer,
difícil de fazer, dirão alguns.
Comungo desta
preocupação, retirando-lhe apenas a carga pessimista.
É verdade que os
casos de sucesso ocorreram em contextos internacionais diferentes, em
circunstâncias diferentes das actuais.
Também é verdade que
a situação internacional não deixa margem para grandes optimismos. A economia
mundial pode estar a aproximar-se de novo de um período de recessão, o que nada
de positivo nos traz enquanto país aberto e vulnerável a choques externos.
Mas os tempos de
crise podem ser momentos de grandes oportunidades. Os países que realizaram o
seu “milagre económico”, não viveram apenas períodos dourados. Conheceram
momentos de grandes dificuldades no seu caminho para o desenvolvimento. O que
os distinguiu e distingue foi e é a sua capacidade, em momentos de crise, de
adaptação ao contexto, de adaptação “prospectiva”, de antecipação dos
desenvolvimentos do contexto internacional, definição de desígnios
estratégicos, e execução de políticas coerentes.
Estes países
apostaram na aceleração do crescimento da produtividade nacional, o factor
determinante do crescimento económico a longo prazo. Incentivaram a poupança
nacional e investiram em infra-estruturas físicas, investiram em tecnologia e
inovação, e acima de tudo apostaram no capital humano, desenvolvendo sistema
educativos altamente eficientes e de excelência, da base ao topo.
É esse o caminho que
devemos trilhar, concedendo a merecida atenção também às questões ambientais e
energéticas.
Minhas Senhoras e
meus Senhores,
Ilustres Convidados
Cabo Verde continua a
ser um país de grandes desigualdades sociais. Os últimos números oficiais
relativos às desigualdades, datados do ano 2007, apontam para um coeficiente de
Gini de 0,47, um dos indicadores utilizados para medir a desigualdade de rendimentos,
o que nos coloca no grupo dos países com maior desigualdade de rendimento, de
entre uma listagem de 162 países publicada pela ONU em 2009.
É certo que se
registou uma evolução positiva na última década, mas o nível actual de
desigualdade dos rendimentos ainda não é comunitariamente aceitável, ele é
visto como socialmente irrazoável. O crescimento económico não
significa, necessariamente, mais desigualdade. Pelo contrário, uma distribuição
mais equitativa da riqueza pode ser um factor de aceleração do crescimento
económico.
Por uma questão de
eficácia, mas também por razões de ordem moral, temos que combater a miséria ao
mesmo tempo que a economia acelera.
O que significa que
podem mostrar-se necessárias políticas activas com o mesmo objectivo, direccionadas
especificamente para a redução das desigualdades mediante a elevação do
estatuto dos que estão, digamos de forma singela, no fundo da tabela. Não
devemos ter medo das palavras. É preciso criar riqueza e ao mesmo tempo
distribuir riqueza pela via de políticas de elevação das condições de vida dos
mais fracos.
A nossa sociedade
deve assegurar a todos um nível de rendimento e condições de vida decentes,
susceptíveis de proporcionar o livre desenvolvimento da personalidade de cada
um, dando, assim, corpo à elementar noção de dignidade da pessoa humana que
confere, a final, fundamento ao estado de direito. A pobreza e as desigualdades
extremas, pondo em risco a coesão social, podem corroer a nossa unidade como
povo.
Ao fim e ao cabo, o
que dizemos nada mais é do que efectivamente realizar o estado de direito e de
democracia de cariz social, tal como vem desenhado e postulado pela
Constituição fundante da II República em que vivemos.
Senhor Presidente da
Assembleia Nacional
Senhoras e Senhores Deputados
Vivemos hoje, a nível
mundial, uma das maiores crises económicas e financeiras dos tempos modernos.
Estamos, como todo o
mundo, imersos neste grande turbilhão da primeira grande crise da globalização
com os efeitos devastadores que está a provocar sobre o emprego, os rendimentos
e as restrições orçamentais de muitos dos países, nossos principais parceiros.
Vivemos também, num
mundo cada vez mais plano, sem limites e sem fronteiras. Para o bem e para o
mal.
É exigido a todos os
países uma nova dinâmica reformista, uma nova forma de olhar para o mercado, o
Estado e as forças endógenas, um novo papel para a competitividade e a
produtividade das empresas e um enfoque na qualificação dos recursos humanos,
no seu bem-estar e no seu capital social.
O futuro está nas
nossas mãos e depende do nosso esforço e do nosso empenhamento.
Cabo Verde tem que se
adaptar aos novos tempos. E essa adaptação às exigências do nosso tempo passa
por uma sociedade civil cada vez mais forte, dinâmica, autónoma, responsável e
ciente da sua relevância. Capaz de se revelar como instância de fiscalização
dos poderes, todos os poderes, mas igualmente como produtora de fluxos de
ideias para o interior do Estado. Precisamos que a política e as instituições
públicas ajudem a este desiderato global, ainda que não sejam totalmente
decisivas.
É preciso desenvolver
na sociedade cabo-verdiana uma atitude competitiva por oposição à mera procura
de rendas económicas ou da protecção do Estado. O trabalho, a responsabilidade,
o mérito, o esforço, a cultura da transparência e do rigor na gestão da coisa
pública, a qualidade, a produtividade e a competitividade são valores que
merecem ser promovidos quotidianamente.
As empresas nacionais
têm que se envolver no desafio que consiste em aproveitar as oportunidades que
um mundo global comporta.
Cabo Verde tem de ser
uma plataforma atractiva de investimento dos cabo-verdianos, residentes e na
diáspora, atractiva para o capital externo em busca de oportunidades de
investimento.
O segredo reside no
papel desempenhado pelo ambiente económico, pelas instituições e pelas
políticas nacionais. São os atributos de uma nação que estimulam as suas
vantagens competitivas.
Por isso, a
necessidade da promoção de uma classe empresarial nacional forte, competitiva,
exportadora e com capacidade para se internacionalizar.
Mas a economia hoje
não é só empresas e mercados. É acima de tudo vivência, sociedade, mobilização,
partilha e satisfação das pessoas. O mercado passou a ter uma dimensão
institucional verdadeiramente nova. Precisamos de promover todas essas
dimensões em Cabo Verde e sobretudo o capital social como condição
essencial para o desenvolvimento.
Temos de nos
diferenciar pela qualidade dos bens e serviços oferecidos, através de uma
verdadeira política de certificação internacional.
Essa exigência obriga
a uma maior preparação académica, científica e tecnológica dos nossos recursos
humanos e das empresas e sobretudo uma grande competitividade do nosso sistema
de ensino e formação profissional e de aprendizagem ao longo da vida.
Exige também uma nova
cultura empresarial sustentada na inovação, na competência e no
empreendedorismo e uma administração pública ágil, despartidarizada e com
espírito de missão.
As universidades têm
de ser capazes e devem ser incentivadas a abrir a suas portas às empresas e às
organizações públicas e privadas para que o conhecimento possa ser a chave de
mudança que Cabo Verde exige e que permite aumentar a competitividade e a
geração de riqueza.
É nas universidades e
nas escolas que se encontra a maior reserva de conhecimento. Delas depende o
aproveitamento da nossa oportunidade demográfica.
Um dos maiores
desafios de futuro para Cabo Verde é o da construção do sistema educativo e de
um ensino superior de alta qualidade, exigente e em linha com elevados padrões.
Temos de saber fazer
despertar toda a sociedade cabo-verdiana e os poderes públicos para a
importância decisiva da aposta na excelência e no rigor do nosso sistema de
educação.
Senhor Presidente da
Assembleia Nacional
Senhoras e Senhores
Deputados
Metade da população
cabo-verdiana tem menos de 22 anos. Um em cada três habitantes tem menos de 15
anos e dois em cada três cidadãos tem menos de 30 anos. Bastam estes números
para revelar a extrema juventude da população cabo-verdiana, e a enorme
responsabilidade que pesa sobre os governantes do país. Os desafios que se
colocam aos governantes na sua relação com a juventude não se situam apenas ao
nível da satisfação de necessidades como a educação de alto nível, ocupação de
tempos livres, saúde para todos, habitação condigna, emprego, segurança e
igualdade de oportunidades na vida para os jovens. Não, a responsabilidade dos
governantes vai mais longe, entra pela esfera de valores. O valor da vida
humana, a liberdade, a tolerância, a aceitação da diferença, a paz social, o
respeito pelos direitos dos outros, a honestidade, o trabalho sério, a
realização pelo trabalho, a responsabilidade social, a igualdade de
oportunidades, a autonomia da pessoa humana. Este combate pelos valores que
devem reger a nossa sociedade é o mais delicado, o mais difícil no nosso mundo
globalizado.
Crente e confiante no
valor e no papel da juventude cabo-verdiana para o futuro de Cabo Verde, os
jovens terão no seu Presidente da República alguém que lhes fala a verdade e
que, não se escondendo atrás do cargo que ocupa, promoverá a cultura do mérito e
da qualidade, incentivará a igualdade de oportunidades, respeitará a
«diversidade das juventudes» e dinamizará iniciativas e programas conducentes
ao despontar do conhecimento e da criatividade nas várias áreas do saber e da
cultura.
Permitam-me que apele
a que levem o vosso país a tocar os céus, se possível! Sereis vós a poder
construir um Cabo Verde mais livre, mais justo e solidário porque mais
desenvolvido e democrático.
Mais do que ser o
país a desafiar-nos, a desafiar-vos, devereis ser vós a interessar-se pelo
futuro e a conquistá-lo.
Excelências,
Nos tempos em que
vivemos – também de evidente crise dos valores positivos tradicionais de Cabo
Verde, da solidariedade, da tolerância, da responsabilidade, do respeito pelos
mais idosos, do brio profissional, da honestidade – uma política activa de
família como espaço privilegiado de realização da pessoa humana mostra-se
inadiável. Ela é ou deve ser o elemento agregador fundamental na sociedade
cabo-verdiana.
Minhas senhoras e
Meus senhores,
No estrito âmbito dos
poderes constitucionais que cabem ao Presidente da República, irei prestar
significativa atenção ao sistema da Justiça e seu efectivo e eficaz
funcionamento, contribuindo para que possa retomar níveis mais razoáveis de
credibilidade aos olhos dos cidadãos.
Sem decisões
reconhecidamente justas, sem uma justiça que gere confiança na comunidade, com
a celeridade desejável e adequada à afirmação de outros valores que o sistema
também deve proteger e afirmar, e acessível aos cidadãos, a coesão social e o
sistema de crenças no ideário democrático ficam abalados. Sistema de justiça
adequado e credível e eleições livres e transparentes são, decisivamente,
elementos estruturantes do regime de democracia.
A Justiça tem que ser
um exemplo de rigor, de credibilidade e de transparência. Os tribunais têm que
ser, sem sombra de dúvida, factores de promoção de uma sociedade de Justiça. O
acesso à justiça tem que ser melhorado e garantido a todos os cidadãos, que não
podem ficar eternamente à espera das decisões dos tribunais.
A questão da
morosidade da Justiça é central no nosso sistema judicial, estando ela ligada a
uma complexa e diversificada teia de factores já devidamente recortada e
estudada. Sem preocupação de minúcias descabidas neste momento, questões como
uma maior capacitação técnica de todos os agentes da justiça, criação de
verdadeiros e autónomos serviços de inspecção, enfim, mecanismos de
responsabilização do sistema no seu todo que, naturalmente, não se confundam
com preterição de princípios basilares do estado de direito como os da
independência do poder judicial e dos juízes, da irresponsabilidade destes pelo
teor de suas decisões e da autonomia do Ministério Público, deverão ser
enfrentadas com coragem política, mesmo que tenham de ser vencidas eventuais e
desajustadas resistências corporativas.
Mas a este
nível, é também preciso encontrar as soluções e os compromissos políticos que
permitam que se realize a Constituição, no que à instalação do Tribunal
Constitucional e ao Provedor de Justiça diz respeito. Não é uma prática
desejável nem exemplar que exigências constitucionais tão precisas estiolem com
atitudes omissivas ou de indiferença de poderes e responsáveis políticos, a
quem cabe, em primeira linha, a tarefa de respeitar e fazer respeitar a
Constituição e de a realizar com efectividade. De mais a mais, trata-se de
instituições fundamentais no nosso Estado de Direito Democrático, seja, num
caso, para a afirmação incondicionada de um cultura constitucional no país, tão
vital para a cultura democrática, seja, no outro caso, para a defesa de
direitos fundamentais e a afirmação da cidadania democrática.
Comprometo-me a
trabalhar, com empenho, para que rapidamente os agentes políticos envolvidos
cheguem aos consensos necessários a uma efectiva instalação daquelas
instituições.
Senhor Presidente da
Assembleia Nacional,
O desenvolvimento
sócio-económico é um imperativo nacional, mas ele apenas será atingido na sua
plenitude de significados se for harmonioso e equilibrado de uma perspectiva de
sua extensão a todas as parcelas do território nacional. Igualmente ele não
será atingido se não for concebido e balizado no quadro da preservação,
desenvolvimento e aprofundamento da nossa já rica e diversificada cultura,
autêntico retrato da alma cabo-verdiana em permanente (re) construção.
A cultura
cabo-verdiana é o verdadeiro esteio da nossa identidade nacional – rica e
plural na sua génese e na constante redefinição de seus contornos externos e
intrínsecos -, nossa âncora nos processos marcantes da nossa história colectiva
e cimento que une ilhas e continentes, cinco de Julho e 13 de Janeiro,
conferindo à nação uma dimensão que extravasa a esfera territorial.
Acarinharei e
apoiarei, nos limites de minhas atribuições e capacidades, essa plêiade de
mulheres e homens que, na transcendência de sua criatividade, recria
incessantemente as emoções e o espírito crioulo nosso. Procurarei contribuir
para que a nossa cultura e, em particular, os agentes e produtores de cultura,
tenham o reconhecimento merecido no país e no estrangeiro e as condições para
um cabal desenvolvimento de sua actividade musical, artística e literária.
Este é também o
momento de lembrar com vigor, com agradecimento, o papel de extrema importância
que a diáspora cabo-verdiana tem desempenhado no desenvolvimento de Cabo Verde
e na consolidação da nossa democracia. A todos os cabo-verdianos residentes no
exterior, a cada homem cabo-verdiano, a cada mulher cabo-verdiana espalhados
pelo mundo envio as minhas saudações fraternais como Presidente da República de
Cabo Verde e auspicio um breve regresso à terra mãe para matar saudades.
A parcela da nação
cabo-verdiana residente fora do país estará sempre no centro das atenções do
Presidente da República, traduzidas primeiramente no reforço do seu sentimento
de pertença a esta Nação, através do estímulo a acções que tenham em vista o
recorte da identidade cultural e a ampliação da participação política. A
integração nos países de acolhimento será igualmente uma das prioridades no
âmbito das competências do Presidente da República enquanto mais alto
representante da Nação cabo-verdiana. Tudo farei nessa direcção, concedendo uma
atenção particular a comunidades residentes em alguns países e que se encontram
em situação especialmente precária.
Uma adequada inserção
dos recursos culturais, científicos, tecnológicos, financeiros e empresariais
dos cabo-verdianos residentes no estrangeiro no processo de desenvolvimento de
Cabo Verde será uma das minhas preocupações permanentes.
Aos nossos
excelentíssimos convidados, representantes de Estados Amigos que honraram esta
cerimónia com a sua presença quero, em nome do povo cabo-verdiano, expressar o
meu reconhecimento e gratidão. Como Chefe de Estado farei uso de todas as
faculdades constitucionais que me são conferidas para promover, de forma
intensa, activa e digna, a aproximação entre os nossos povos. Estarei
disponível para, no quadro das nossas relações entre Estados, garantir que o
diálogo, o entendimento e os valores comuns da democracia e do respeito mútuo
prevaleçam sempre. Mais uma vez meus sinceros agradecimentos pela vossa
respeitável presença.
Excelências,
Gostaria de saudar,
com respeito, o Presidente cessante Comandante Pedro Verona Rodrigues Pires e
agradecer o contributo que, na Presidência da República, deu para a afirmação
de Cabo Verde no mundo. Desejo-lhe e à Excelentíssima Esposa as maiores
felicidades na vida pessoal e familiar.
Ao Dr. Mascarenhas
Monteiro, primeiro Presidente eleito democraticamente em Cabo verde, as minhas
mais vivas e respeitosas saudações, desejando-lhe, bem assim à Excelentíssima
Esposa, as maiores felicidades.
Ao Presidente
Aristides Pereira, os meus cumprimentos igualmente respeitosos, extensivos à
Excelentíssima família, e os votos de rápidas melhoras.
Seja-me permitido,
num acto solene como este, exprimir ainda mais alguns sentimentos pessoais.
Abrir o coração e dizer alguma coisa do que me vai dentro.
É na energia que
emana do corpo e da alma dos que no dia- a -dia constroem Cabo Verde e que, nas
memoráveis jornadas democráticas de Agosto, assumiu expressão ímpar, que busco
forças para colocar todo o meu ser ao serviço do país.
Quero continuar a
fazer parte desse caudal quase indomável que é a proverbial tenacidade do Povo
destas ilhas e contribuir para que cada vez mais ela se transforme de facto num
instrumento de mudanças profundas nas condições de vida de todos os
cabo-verdianos.
Queria, outrossim,
agradecer aos muitos milhares de cabo-verdianos anónimos, nas ilhas e na
diáspora, que quiseram que hoje prestasse este juramento perante a Nação. Em
especial a todos quantos, de forma abnegada, colaboraram de perto comigo na
grande aventura democrática que acaba por desembocar igualmente nesta cerimónia
singela mas memorável. Destaco a minha família que nunca me regateou o apoio e o
amparo necessários.
Muito obrigado a
todos!
Enfim, permitam-me
evocar a memória de meu pai, que seguramente, em silêncio mas de forma
inteligente, contribuiu para que este evento tivesse tido lugar hoje.
Senhor Presidente da
Assembleia Nacional, Minhas Senhoras e meus Senhores,
Estamos cientes de
que a grandeza nunca é um dado adquirido. Deve ser conquistada. A nossa viagem
como povo nunca foi feita de atalhos ou de aceitar o mínimo. Não tem sido o
caminho dos que hesitam, pelo contrário, tem sido o dos que correm riscos, os
que agem, os que fazem as coisas. Temos sido um povo que muda constantemente a
sua condição e reescreve o seu destino por actos de sabedoria, coragem e
perseverança. Estas ilhas viram a chegada dos primeiros colonos, a chegada dos
primeiros escravos. Juntos vencemos a escravatura, derrubámos o colonialismo e
promovemos com sucesso um regime baseado na liberdade e no respeito pelos
direitos humanos.
Por todas estas
razões acredito que nós como povo venceremos os desafios do futuro, juntos
seremos capazes de ganhar novos horizontes, novas perspectivas e oferecer aos
nossos descendentes um Cabo Verde mais livre, mais desenvolvido, mais humano e
que nos possa orgulhar a todos.
Muito obrigado.
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